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Segunda-feira, 13 de maio de 2024
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Deusval Lacerda

deusvallacerda@bol.com.br

16/06/2016 - 08h06

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Deusval Lacerda

deusvallacerda@bol.com.br

16/06/2016 - 08h06

Brasília: o Céu é o limite

Por mais que se queira levar o governo interino de Michel Temer a sério não há nada que ajude nesse sentido. Quem tem um mínimo de consciência, clarividência e retidão de princípios não pode nem pensar nisso. A camuflagem do crime de responsabilidade atribuída à presidente Dilma Rousseff choca a inteligência humana. Por mais que se queira ser brasileiro e, por isso, dar um voto de confiança nesse arremedo de governo, torna-se tarefa estomacalmente impossível.

 

Já desconfiávamos das boas intenções de um eventual governo Temer, mas tudo ficou explícito quando vimos a forma, o jeito, a razão e o compromisso de muitos parlamentares que votaram a favor de impeachment na Câmara dos Deputados. A má impressão ficou evidente quando os acordos partidários subjugaram o presidente provisório e o impeliram a nomear para o seu ministério políticos inexpressivos, incompetentes e inexperientes e, achando pouco, outros tantos acusados na operação Lava Jato.

 

Governo instalado, a coisa ficou pior do que se achava que poderia ser. Até o incensado ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, foi tungado. Ele começou o governo com o ímpeto de fazer as coisas certas, só que no governo errado, e aí foi repelido quando propugnou por um plano econômico com forte ajuste fiscal e começou logo suprimindo ministérios, fechando embaixadas e impingindo corte de pessoal (proposta de 4 mil cargos comissionados) e, contrário senso, a Câmara com a aquiescência do governo aprovou megapacote de reajuste do funcionalismo federal (Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público), com a criação de 14.419 novos cargos, com impacto nos gastos públicos de R$ 58 bilhões até 2019.

 

Tudo isso em acerto de contas ao apoio recebido pelos poderes para aprovação do impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. E os aprovadores dessa farra financeira foram os mesmos parlamentares que escamotearam a nossa Constituição em favor do surgimento do governo provisório do Temer.

 

Mas a sanha para usar o governo para aprovar o afastamento da presidente Dilma a qualquer custo, ancorado no crime de responsabilidade, não ficou só na Câmara, está sendo utilizado também no Senado da República. Para exemplificar, a seção RADAR, da revista Veja (edição 2.482 de 15/06/2016), assinada por Vera Magalhães, traz a nota intitulada BAIXINHO NA BANHEIRA: “A cada dia, a dúvida do senador Romário (PSB-RJ) em ralação ao impeachment de Dilma Rousseff ganha mais materialidade. Além de uma diretoria em Furnas, o Baixinho pediu – e levou – a Secretaria Nacional da Pessoa com Deficiência, do Ministério da Justiça. Indicou a ex-deputada alagoana Rosinha da Adefal, que é cadeirante”. Na mesma seção, com o título TÊTE-À-TÊTE, informou: “Outro indeciso, o senador Cristovam Buarque ((PPS-DF) teve um jantar a sós com Temer na semana passada. Ninguém no Senado acredita que, ao vivo na TV, ele votará pela volta de Dilma”.

 

Ainda na seção RADAR, com o título NOVO EIXO?, disse: “O jantar entre Temer e a cúpula do PSDB esboçou um pacto de aliança comandada pelos dois partidos em 2018 para isolar o PT. Em toca de apoio, agora sem disfarces, dos tucanos ao governo, o PMDB se engajaria no projeto do PSDB – seja quem for o candidato a presidente. Temer e o senador Aécio Neves trocaram até um abraço emocionado na saída do Jaburu”.

 

Na mesma edição da revista, diz a matéria MUDOU O JOGO: “O novo jogo, ao projetar os holofotes sobro o PMDB (gravações feitas por Sérgio Machado e que geraram os pedidos de prisão dos senadores Romero Jucá e Renan Calheiros, que preside o Congresso, do presidente afastado da Câmara Eduardo Cunha e do ex-presidente Sarney), constrange o governo Temer na medida em que atinge os seus ministros e aliados, enquanto colhe do próprio presidente interino um silêncio incômodo. Temer não pode ativar a Lava Jato e magoar os aliados, nem criticar a operação e se indispor com a opinião pública. Piores ainda são os sinais cada vez mais inequívocos para salvar a cabeça de Eduardo Cunha e suas contas suíças”.

 

Ainda na revista Veja na matéria CONTAS SECRETAS, paradoxalmente, traz o juramento de posse dos senadores e deputados, que diz: “Prometo guardar a Constituição Federal e as leis, desempenhar fiel e lealmente o mandato que o povo me conferiu e sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil”. Só que de acordo com o comportamento de grande parte dos parlamentares do Congresso Nacional, o verbo guardar a CF e as leis não está sendo aplicado no sentido de defender, preservar, proteger, mas no de deixar de pronunciar, de comunicar, de expressar, ou seja, ocultar e calar a CF e as leis.

 

Como visto, não adianta os entusiastas do conservadorismo, da direita e do golpe se afobarem, não houve crime de responsabilidade, não houve razão constitucional para o afastamento da presidente Dilma, houve, sim, a tomada do poder pelo poder, tanto na Câmara dos Deputados como agora estão agindo também no Senado da República. Para isso, o Céu é o limite. Isto é de uma falta de cidadania sem limites. É um erro crasso, estúpido, provinciano, coisa de bocó, ser contra o PT e descontar na democracia para conquistar o seu intento, em vez de enfrentar as eleições, como se o Estado fosse só a política. É realmente mentalidade tribalista, terceiro-mundista, cujos seguidores contribuem para o atraso sistêmico do Brasil, por enxergarem somente eles próprios e os seus próprios narizes. 

 

Deusval Lacerda de Moraes é economista

Deusval Lacerda

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