A nutricionista Tamara Lazarini, de 34 anos, admite que sempre gostou de comprar – e muito. O desejo de gastar era tão grande que ela adquiria coisas que nem chegava a usar. “Quando vi, tinha uns 15 vestidos pretos. Também eram tantos perfumes que alguns venceram ainda fechados”, conta. O consumo impulsivo era tamanho que, em uma viagem, Tamara teve de comprar uma mala extra só para trazer um regador que achou bonito, mesmo sem ter um jardim para utilizá-lo.
Há muitas pessoas na mesma situação de Tamara. De acordo com uma pesquisa do SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito) realizada em fevereiro, 85% dos consumidores admitem que compram sem qualquer planejamento. Entre os principais motivos apontados para gastar sem pensar estão a ansiedade (47%) e a insatisfação com a própria aparência (44%). Desta forma, quatro em cada dez entrevistados dizem ter consumido por impulso em momentos de baixa autoestima, tristeza ou angústia.
Foi assim também com Tamara, que passou a gastar ainda mais depois do fim do casamento, quando entrou em depressão. “Comprar era uma alegria momentânea, uma sensação de prazer enorme, parecia que ia resolver a minha vida. Mas logo depois, isso tudo passava. Era algo fora do controle”, assume ela – que, dois anos depois, com a ajuda de terapia, acupuntura e religiosidade – conseguiu controlar melhor as finanças.
Mas nem todos tomam consciência do problema. Muitos acham natural gastar além da conta e nem percebem que, além de não conseguir resolver os problemas emocionais, ainda por cima estão chegando à insolvência. “Na maior parte das vezes, o objeto não resolve as questões de autoestima ou de felicidade. Então, retorna-se às compras de outras coisas para preencher este vazio”, explica a filósofa Maria Helena Pires Martins, professora da Universidade de São Paulo e autora do livro “O Prazer das Compras – O Consumidor no Mundo Contemporâneo” (Editora Moderna, 2007).
O psicólogo Mário Ernesto René Schweriner, coordenador do Núcleo de Ciências do Consumo da ESPM, explica que comprar por impulso é apenas um dos mecanismos de compensação para suprir carências que nada têm a ver com o universo material. “Alguns vão para a igreja, outros se tornam workaholics, outros bebem, outros consomem”, explica.
Em seu consultório, a psicóloga Paula Schurt, especialista em terapia financeira, detectou também que a insegurança é outro fator bastante presente nas compras por impulso. “A pessoa tem medo de arriscar, de se expor. Precisa de algo externo para lhe dar esta sustentação. Então, ela compra uma roupa bonita para mostrar que é legal, que é confiante”, diz.
Classe social
A pesquisa do SPC também mostra que a ansiedade por um evento que se aproxima, como festas, jantares e viagens, é a razão mais decisiva para as compras por impulso entre os consumidores de classes A e B. Por outro lado, a baixa autoestima é o motivo mais citado entre os entrevistados das classes C e D. Problemas no trabalho, questões familiares, desilusões amorosas e até tensão pré-menstrual também foram mencionados como motivadores para abusar do cartão.
Segundo Schweriner, da ESPM, homens e mulheres tendem a assumir padrões de comportamento de compra diferentes para suprir as carências emocionais. Ele diz que as mulheres geralmente adquirem itens relacionados à aparência, como roupas, sapatos, maquiagem e serviços de cabeleireiro, por exemplo. Já os homens consomem mais eletroeletrônicos, artigos para carro e bebidas. “O impulso é uma condição da natureza humana, mas você pode controlá-lo. Se você pensa antes, não vai comprar 90% do que pensa que quer”, afirma o psicólogo.
A pesquisa do SPC entrevistou 646 consumidores em diversas capitais do País. A margem de erro é de 3,9%.
Confira a seguir 12 dicas para evitar as compras por impulso:
1. Conte até dez
Pode parecer estranho, mas contar mentalmente até dez – ou até 20, se precisar – significa acionar o aspecto racional e, assim, ajudar a controlar o impulso. É o que acontece quando contamos até dez antes de xingar alguém no trânsito, por exemplo. “Este processo exige treino, não tem outro jeito”, afirma o psicólogo Mário Ernesto René Schweriner, coordenador do Núcleo de Ciências do Consumo da ESPM.
2. Diferencie necessidade de desejo
Se o seu celular quebrou, o aparelho se torna um item necessário. Mas se você apenas quer trocá-lo por um modelo mais bonito, este se configura como um desejo. Portanto, avalie muito bem antes da compra. Talvez o item em questão possa esperar uma promoção ou mereça uma pesquisa mais detalhada de preços.
3. Não feche o negócio na hora
Olhe, experimente e... vá para casa. Depois, analise o negócio com calma, verifique se cabe no orçamento familiar e veja se vale mesmo a pena fazer aquela compra. “Uma dica é se perguntar: ‘é necessário? Vou usar bastante? Tenho onde guardar? Vale a pena o custo-benefício?’”, indica a professora Maria Helena Pires Martins.
4. Faça contas
Coloque o orçamento mensal no papel. “É importantíssimo saber o quanto a pessoa ‘custa’ por mês”, declara Paula Schurt, especialista em terapia financeira. Para facilitar, a profissional indica anotar todas as despesas e separá-las por categoria. Assim, por exemplo, a pessoa saberá que pode gastar R$ 100 por mês com roupas, por exemplo - e evita ter que desembolsar mais que o previsto.
5. Trace metas
Quando se tem um sonho ou uma meta, como a compra da casa própria ou uma viagem para o exterior, pode ficar mais fácil abrir mão do centésimo par de sapato em prol de um objetivo maior.
6. Anote e espere
Outra maneira de controlar a compra impulsiva é adotar o método do bloquinho. Se quer muito um determinado produto, anote em um caderninho o valor e a data e guarde em uma gaveta. Depois de um mês, veja as anotações e verifique se o objeto ainda é tão desejado assim. Provavelmente você terá até se esquecido dele.
7. Tome cuidado com os modelos familiares
Se seus pais sempre estiveram endividados, faziam financiamentos que nunca terminavam ou consideravam a utilização do limite do cheque especial como parte da renda, é bom rever seu modelo de planejamento financeiro. “Nestes casos, as chances de fazer igual é muito grande. É preciso identificar estes padrões e promover a mudança”, indica Paula Schurt.
8. Deixe cartões e cheques em casa
Se está difícil vencer a tentação, deixe cartões e talões de cheque em casa quando for a lugares onde certamente você irá gastar mais que o previsto. Com dinheiro vivo, fica mais claro visualizar o valor que se está pagando por determinado produto e, assim, pode-se pensar melhor sobre a compra.
9. Arrume seu guarda-roupa mais vezes
Pode parecer bobagem, mas, ao organizar seus pertences em casa, poderá ver que tem muito mais coisas do que se lembrava. Você irá refletir melhor antes de comprar mais um sapato preto, porque sabe que já tem cinco deles no armário.
10. Evite o shopping
Sempre que quiser sair para se distrair, fuja de shoppings e lugares que incentivem o consumo. Convide um amigo para passear em um parque, tomar um sorvete ou praticar exercícios. Além de ser mais saudável, evita rombos no orçamento.
11. Adote uma postura positiva
Ao detectar que não dá para sair comprando, tenha uma atitude positiva e não fique se lamentando. Ao invés de dizer ‘eu não posso comprar aquela blusa maravilhosa que vi no shopping’, diga ‘eu não quero comprá-la agora porque preciso organizar minhas contas’. “Se a pessoa percebeu que está endividada, ela tem de encarar esse freio nas compras e pensar que, depois de organizar as finanças, vai conseguir fazer mais investimentos e comprar muito mais”, explica Paula Schurt.
12. Procure ajuda
Se nada adiantou e as compras por impulso estão tomando proporções maiores, vale a pena buscar ajuda de um profissional. “Com a psicoterapia, a pessoa pode descobrir a raiz do problema e resolvê-lo. Se chegar a ser um vício, será tratado como qualquer outra adição”, comenta Maria Helena Pires Martins, autora de “O Prazer das Compras”.
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