O aumento da renda, proveniente da valorização do salário mínimo, mudou a estrutura do mercado de trabalho no meio rural, revela estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). "Houve uma debandada da mão de obra. Um grupo expressivo está preferindo ficar em casa a ir para a lavoura", destaca o economista Rodrigo Leandro de Moura.
A opção por não trabalhar na agropecuária não indica, contudo, transferência da mão de obra para as cidades e aumento da migração, como ocorreu na história recente da economia brasileira. Ao contrário do passado, os anos 2000 são marcados pela migração rural em patamar equivalente ao do período ainda de nascimento da industrialização, nos anos 50, embora, ressalte Moura, dessa vez, haja um contingente muito menor de trabalhadores instalados no campo.
A pesquisa do Ibre/FGV utiliza como base os dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (Pnad), relativo ao cenário de 2011. A divulgação mais atualizada sairá em setembro, quando o estudo será revisto.
Mas, segundo o economista, as mudanças ocorridas no mercado de trabalho rural foram estruturais e permanecem. Mesmo a inflação crescente neste ano não é capaz de reverter as transformações, porque o reajuste do salário mínimo, balisador da aposentadoria, supera a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e garante a manutenção dos ganhos adquiridos.
"Ficaria muito surpreso se algo mudasse repentinamente. São fatores estruturais que, dificilmente, são revertidos de um ano para outro", destaca Moraes. Além disso, diz ele, o avanço expressivo do Produto Interno Bruto (PIB) do setor agropecuário no primeiro semestre deste ano indica queda da população ocupada no meio rural e aumento da produtividade, retrato condizente com o quadro assinalado pelo estudo do Ibre/FGV.
A queda de 1,9% da população ocupada no campo, de 2004 a 2011, está relacionada a um movimento crescente de antecipação de aposentadorias, sobretudo, entre trabalhadores com menos escolaridade, de zero a sete anos de estudos.
A expansão do salário mínimo fez com que a renda média mensal decorrente da aposentadoria superasse à do trabalho, de 2004 a 2011 - 5,08% ante 4,7%, respectivamente. A média da renda com o trabalho é de R$ 490 e com a aposentadoria, de R$ 693.
Com mais dinheiro para custear o orçamento, as famílias estão podendo deixar suas crianças e jovens de 10 a 17 anos permanecerem mais tempo na escola, em sistema de dedicação exclusiva, distantes da lavoura. Soma-se à contribuição da aposentadoria, as melhores condições do acesso à escola, revela o estudo.
A consequência imediata é a queda de 1,7% da taxa de participação da força de trabalho rural, no período. Ou seja, caiu o números de pessoas em idade para trabalhar que optaram por buscar emprego no campo, nos sete anos. E as mudanças pouco têm a ver com os programas sociais do governo, segundo o Ibre/FGV. Apenas 3,7% da queda taxa de participação da força de trabalho são relativas ao aumento real de benefícios sociais entre 2004 e 2011.
Daniela Rocha, que divide com Moura o estudo, salienta, contudo, que os produtores agrícolas estão compensando a redução da oferta de mão de obra com programas de qualificação dos trabalhadores para que operem máquinas, cada vez mais presentes no campo. Ela cita o caso dos produtores de cana-de-açúcar, que optaram por qualificar seu pessoal já empregado, em vez de contratar pessoal treinado.
A permanência dos jovens por mais tempo nas escolas também tende a contribuir para que o setor agropecuário mantenha o crescimento da produtividade, porque permitirá que uma fatia maior de estudantes alcance o segundo grau técnico especializado, de acordo com Daniela. Ainda assim, "há uma discussão muito grande sobre até que ponto a mão de obra rural consegue se adequar aos avanços tecnológicos. O meu palpite é que há dificuldade de absorção do trabalhador", ressalta Moura. Isso explica em parte a antecipação da aposentadoria por alguns. Sem conseguir espaço no mercado, eles buscam solução na previdência.
Os cenários, na verdade, variam de acordo com as regiões do país. A carência por mão de obra é maior no Nordeste, enquanto o Centro-Oeste é favorecido pela migração do meio urbano para o rural, em decorrência dos resultados extraordinários dos mercados de soja, milho e pecuária.
A queda da população rural ocupada acaba por repercutir também sobre o mercado de trabalho urbano, diz Moura. "Um potencial menor de trabalhadores rurais tem suprido as cidades", afirma. E a perspectiva é de manutenção deste quadro, ao menos no curto prazo. "A mudança é estrutural", reforça o economista.
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