As regiões Sudeste e Nordeste do Brasil perderam juntas cerca de 105 trilhões de litros d’água por ano entre 2012 e 2015. A estimativa é do hidrologista brasileiro Augusto Getirana, pesquisador assistente no Goddard Space Flight Center da agência espacial norte-americana (Nasa), em Maryland, nos Estados Unidos. Em um estudo publicado em outubro na revista Journal of Hydrometeorology, ele analisou variações do armazenamento total de água no Brasil, das águas superficiais — como rios, lagos e reservatórios — às subterrâneas — como aquíferos e a umidade do solo — entre 2002 e 2015. Usou para isso um conjunto de dados obtidos por dois satélites Grace (sigla para Gravity Recovery and Climate Experiment) da Nasa. Esses satélites foram usados porque são capazes de detectar dois tipos de variações: no campo gravitacional da Terra, em geral causadas pelo movimento de grandes massas d’água, como rios e aquíferos subterrâneos; e ao medir a altura da camada de água.
De fevereiro de 2012 a janeiro de 2015, ele verificou, a quantidade de água nas regiões Sudeste e Nordeste do país diminuiu significativamente. Nesse período, essas regiões perderam, no total, 56 quilômetros cúbicos (km3) e 49 km3 de água, respectivamente. Os satélites Grace também medem a quantidade de água a partir da altura da camada de água entre o fundo e a superfície de rios, reservatórios e lagos. Se a camada tiver mais de 1 centímetro (cm) de altura, o satélite detectará e fará a medição. Por essa medida, em comparação à média dos últimos 13 anos, o Sudeste dispunha de 4,1 cm menos de água enquanto o Nordeste teve 3,7 cm menos de água.
As represas e reservatórios brasileiros também foram avaliados. Segundo o estudo, eles atingiram os níveis mais baixos desde 2005. Para se ter ideia, os 16 reservatórios avaliados no estudo — entre eles de Furnas, Ilha Solteira e Três Marias —registraram capacidade mínima de armazenamento de água nos últimos 12 meses. O reservatório de água do sistema Cantareira, responsável pelo abastecimento de aproximadamente 8,8 milhões de pessoas na Região Metropolitana de São Paulo, em setembro de 2014, por exemplo, tinham preenchido apenas 10,7% de sua capacidade total.
Em 2002, quando os satélites começaram a coleta de dados, o Brasil havia acabado de passar por um período de seca iniciado em 2000. Um período mais úmido estendeu-se até 2012, quando, novamente, a baixa incidência de chuvas, associada ao aumento das temperaturas médias, voltou a predominar em grande parte do território brasileiro, configurando-se mais tarde na pior seca do país em 35 anos. Análises mais detalhadas dos dados produzidos pelos satélites Grace ao longo de 13 anos mostraram que o Brasil tem oscilado entre períodos ora mais secos, ora mais úmidos. Desde 2011, no entanto, um novo período de seca estabeleceu-se no país, sobretudo nas regiões Sudeste e Nordeste.
Augusto Getirana pretende seguir monitorando variações do armazenamento de água no país, mesmo diante da possibilidade de os satélites Grace serem desativados em breve. Ele explica que ainda é difícil fazer projeções relacionadas à situação hídrica do país para os próximos anos. “Satélites observam o presente e levam um certo tempo para processar os dados para que, então, sejam disponibilizados para uso científico”, diz. “Isso faz com que esses dados, de certa forma, se tornem obsoletos. Daí a importância do monitoramento contínuo da distribuição de água no Brasil.”
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