O financiamento das campanhas eleitorais é questão fundamental para a democracia: campanhas custam dinheiro e os candidatos que têm mais para gastar levam vantagem sobre os demais. Inexiste, assim, o princípio da igualdade de condições para todos. Os que têm mais “capacidade de arrecadação” são, geralmente, considerados favoritos e os resultados mostram que com mais dinheiro há mais chances de ser eleito.
O problema de como financiar as campanhas eleitorais é discutido em praticamente todos os países, não é só no Brasil nem só por causa da Lava Jato. Está sempre presente a questão do poder econômico nas eleições. Em alguns países europeus, inclusive, a legislação sobre o assunto mudou depois de escândalos envolvendo doações privadas para campanhas. Em outros se busca, como no Brasil, um modelo de financiamento mais adequado ao espírito democrático – embora se saiba que nenhuma das fórmulas é perfeita e isenta de defeitos.
Nas eleições municipais de 2016 a doação por empresas passou a ser proibida no Brasil. Há um movimento para que essa decisão seja revertida, sob a alegação de que o financiamento público será muito oneroso para a população – ainda mais num momento em que os recursos do Estado andam escassos – e as pessoas físicas não são capazes de sustentar campanhas, especialmente majoritárias. Isso, apesar dos males causados pelo financiamento empresarial, como tem demonstrado a Lava Jato.
Há uma questão, porém, que não só está ligada como deveria anteceder a discussão sobre o financiamento das campanhas: como reduzir os custos das campanhas eleitorais e, ao mesmo tempo, aproximar mais os eleitores dos eleitos e dar mais representatividade aos parlamentares e governantes. Com campanhas mais baratas, será mais fácil definir seu financiamento e derrubar os argumentos favoráveis à presença do dinheiro doado por empresas.
Alguns falam em eleição de vereadores e deputados pelo sistema distrital, no qual o candidato disputa votos em uma área territorial menor do que um município ou um estado. Outros defendem o voto em lista partidária fechada, na qual o eleitor vota no partido e não em candidatos, individualmente, o que faz a campanha ser mais barata. Fala-se também em programas de TV centrados em debates e falas dos candidatos e não em dispendiosos recursos visuais e sonoros.
De qualquer maneira, eleição tem custo e, quanto maior o território a ser trabalhado, mais se gasta. Um candidato a presidente da República, por exemplo, tem de viajar pelo país. Um postulante ao Senado tem de obter votos em todo o estado. Nos últimos anos muitas práticas foram proibidas, como os showmícios e algumas formas de propaganda, e assim despesas foram cortadas. Mas as campanhas continuam precisando de dinheiro.
Há, geralmente, três alternativas apresentadas para o financiamento de campanhas: 1) exclusivamente com dinheiro público; 2) por empresas e pessoas físicas, com parcela menor de recursos públicos (fundo partidário e isenções para emissoras), como era no Brasil até 2016; 3) por pessoas físicas e dinheiro público, forma hoje em vigor no país. Raramente se cogita de recorrer unicamente ao financiamento por pessoas físicas.
Os partidos políticos brasileiros recebem recursos públicos por intermédio do chamado fundo partidário, cuja denominação é Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos. Em 2016 foram R$ 820 milhões para 32 partidos, mesmo valor previsto para 2017. Todas as agremiações registradas no Tribunal Superior Eleitoral dividem igualmente 5% do fundo e 95% são repartidos de acordo com o número de deputados federais eleitos.
Para cobrir os gastos com eleições seria preciso muito mais do que isso, em um fundo específico. Isso provoca reações contrárias, algumas autênticas e outras demagógicas – do tipo “esse dinheiro poderia ir para a saúde” – mas o financiamento público é adotado por inúmeros países e em vários deles chega a custear 80% dos gastos com campanhas. O que difere é o critério usado para liberar o dinheiro para os partidos e candidatos, e que em muitos casos, por excluir organizações menores, acaba impedindo que forças políticas novas recebam os recursos e possam crescer.
O financiamento público pode ser completado com os recursos obtidos de pessoas físicas, mas cai toda a preocupação com a igualdade de condições entre os candidatos se não houver um teto fixo, em reais, para essas contribuições. Se o limite for com base em um percentual do rendimento anual, como atualmente, pessoas com renda maior poderão contribuir com muito mais do que um cidadão com renda baixa.
A combinação entre redução dos custos das campanhas e a soma do financiamento público com as doações por pessoas físicas, com um limite por CPF – R$ 10 mil, por exemplo – certamente dará maior igualdade de condições aos candidatos. Custará mais aos cofres públicos que o fundo partidário – que poderá ser extinto, pois não cabe ao Estado financiar as atividades rotineiras de partidos políticos – mas é um custo necessário à democracia.
As doações de pessoas físicas são indicadores importantes, pois um partido que não consegue o apoio financeiro de militantes e simpatizantes não tem enraizamento social. Os recursos públicos podem ser divididos entre os partidos de acordo com a votação obtida por cada um na eleição anterior, estabelecendo-se critérios justos que beneficiem os que tiverem mais eleitores, mas, ao mesmo tempo, não impeçam que um partido novo possa se firmar. Pode ser, por exemplo, um percentual para todos os partidos e outro, maior, de acordo com a votação obtida.
Não é fácil definir esses critérios e explicar à população que, tal como acontece em vários países, o financiamento público das campanhas somado às doações limitadas de pessoas físicas é a melhor alternativa para uma disputa democrática. A pior é restaurar o financiamento por empresas privadas, que, como se vê, é uma das grandes fontes da corrupção que assola o país. Com ou sem caixa dois.
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Hélio Doyle - Jornalista, professor aposentado da UnB.
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