Não há dia em que não ouça no Congresso, nos corredores da universidade onde dou aulas, no ônibus, no shopping, na padaria, na fila do banco, onde eu for, uma mesma e única pergunta: “Trabalha no Congresso, conhece os ‘home’. Tu achas que isso vai dar em quê?”
Sei lá. Não tenho a menor ideia. E quem disser que sabe está mentindo ou é mal informado. Qualquer previsão é chute. Os mais experimentados na observação dos altos e baixos da cena política brasileira só se arriscam a dizer que esta crise – política, ética e econômica – é mais grave do que a que desaguou no desastre de 64. Marola gorda, ressaca braba, confusão pra mais de metro.
Convido o leitor a lembrar comigo os ingredientes do bolo mais indigesto que a conjuntura política brasileira foi capaz de elaborar ao longo de sua turbulenta trajetória. Se quiser acrescentar outros, fique à vontade, esses aqui são apenas os que me ocorrem agora: 1) denúncias de corrupção bilionária em todos os níveis e em todos os governos, de Lula pra cá, com tentáculos que alcançam boa parte do Congresso, levando alguns pro xilindró + inexistência de nitidez ideológica do quadro partidário, fragmentado numa miríade de legendas, a maioria desconhecidas ou, apenas, insignificantes + ausência de um projeto consistente para o país, que vem operando há décadas na base do bate-enxuga, guardando o almoço pra comer no jantar + lentidão modorrenta das decisões judiciais, elevando a sensação de impunidade generalizada + judicialização das decisões políticas mais necessárias ao país por inércia do Congresso + desinformação e pouco caso do eleitorado, que reage de forma fisiológica e/ou emocional a apelos demagógicos e populistas + esfarelamento das lideranças políticas de relevo à esquerda e à direita + crise econômica sem precedentes, com ênfase no desemprego + isto + e aquilo. Misture tudo e acrescente a turbulência das ruas. Dá pra engolir?
Cada um desses ingredientes, separado, contém nitroglicerina em dosagem superior à dos mísseis em teste pelo gordinho coreano. Se separados são aterradores, calcule associados. Antes de Joesley montar a arapuca, fazer aquelas gravações e abrir o bico na delação premiada, a suposição era a de que Temer seria a pinguela que levaria o país até o outro lado da crise (leia-se: eleições de 2018).
O diabo é que os irmãos Batista soltaram a boiada na estrada, a pinguela despinguelou e a descrença se instalou depois da apresentação da denúncia contra o pai do Michelzinho. Aposto que nem Marcela tem segurança em sua permanência naquela pousada às margens do Paranoá, onde voejam jaburus e outros aviões de carreira. Hoje, o país balança perigosamente num cipó esgarçado, que pode se romper a qualquer momento. E aí? Isso vai dar em quê?
Seja qual for o desfecho, tem se falado pouco sobre um aspecto altamente preocupante desse imbroglio: mistura de crise com ausência de lideranças confiáveis, como ensina a história, é caldo de cultura fértil para o surgimento de aventureiros salvadores da pátria com seus discursos demagógicos e populistas. Num passado recente tivemos um desses, que se proclamava caçador de marajás. Terminou caçado. Noutros países desta alegre Latinoamerica a piada se repete, só que em forma de tragédia.
A expressão “ausência de líderes” parece vazia. Mas, francamente, olhe em torno e responda depressa: que líderes – aqui, no sentido de figuras públicas com ficha limpa e competência pra pilotar aquela cadeira do Palácio do Planalto – temos hoje à disposição? Isso mesmo, leitor: entendo seu silêncio. Pois o vazio é de tal ordem que já se fala na possibilidade de se ter de “inventar” um nome que segure o tchan até 2018.
Por isso me recuso a responder quando alguém me pergunta em quê vai dar tudo isso. E não há neste mundo quem me obrigue a responder. Sempre fui ruim de bola: nunca aprendi a chutar.
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Paulo José Cunha é poeta, jornalista, professor e documentarista piauiense.
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