Esperar em consultório médico faz parte da rotina dos velhos. No meu caso, não tenho razões para queixas: tenho sempre um bom livro à mão. Estou na sala de espera de um consultório quando se sentam ao meu lado uma jovem e um velho sequestrado pelo mal de Alzheimer. A moça, solícita, tentava vãmente trazer o avô ao convívio do mundo. Indiferente a tudo, o cidadão, olhos mortiços, contemplava o nada. De repente, passa uma atendente jovem, alegre e (como direi?) um tantinho fornida... O velho se vira e acompanha, com o olhar, a trajetória da moça. Achei estranho, mas poderia ter sido apenas um gesto involuntário. Eis que a atendente retorna, e o cidadão volta acompanhá-la com o olhar. De repente, levanta-se e diz para a neta: “Quero a moça bonita”. A jovem não se contém e começa a sorrir. Eu, também.
Foi aí que me lembrei do dito popular: “Bode velho pode perder o pelo; o cheiro, nunca”.
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Cineas Santos é professor, escritor e produtor cultural - nas redes sociais.
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