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Sexta-feira, 01 de novembro de 2024
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VC no Acesse

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acessepiaui@hotmail.com

13/03/2018 - 07h06

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acessepiaui@hotmail.com

13/03/2018 - 07h06

Meu filho, cuidado! militares têm armas e estão do lado do cabo

Um amigo de universidade foi pego pela polícia federal e foi torturado, pegando choque no saco para entregar “a célula”. Enlouqueceu.

 

A censura. Num primeiro momento pensei em escrever censura com o “c” maiúsculo. Depois concluí que não, censura não deve ser nem minúscula, deve é não existir.

Nos “anos de chumbo”, quando as forças armadas apitavam o jogo, minha mãe comentava: “meu filho, cuidado com o que você escreve; os militares têm armas e eles estão do lado do cabo”...

Na época, censura rimava perfeitamente com tortura. Um amigo de universidade, em Brasília, foi pego pela polícia federal com um livro proibido, de esquerda, quando voltava da biblioteca da UnB. Passou a noite sendo torturado, pegando choque no saco para entregar “a célula”. Enlouqueceu. Largou o curso de engenharia, voltou para São Luiz e acabou seus dias pulando (e fugindo) de hospício em hospício até morrer. Meus faceamigos Pedro Anísio Figueiredo e Aderval Borges conhecem essa história e seu protagonista.

Na redação dos jornais brasileiros, depois do AI-5, em dezembro de 1968 (um presentão de Natal e Ano Novo!), invariavelmente tinha um coronel para dar a palavra e dizer o que devia e o que não devia sair em suas páginas. Lembro que certa vez, em visita ao Palácio do Planalto, uns índios da Amazônia colocaram um cocar de penas na cabeça do presidente Médici, o mais linha dura dos linhas duras. A foto chegou a sair no Correio Braziliense, mas foi imediatamente vetada para os outros jornais brasileiros. Coisas tolas assim.

O filme censurado mais famoso era Teorema, de Pier Paolo Pasolini, uma alegoria à vida burguesa. Mas tudo era censurado. Tudo. Chico Buarque quase pira, era o mais visado. Se mandou para Roma na época. Até falou recentemente que, se o Lula for preso, ele se manda para Paris onde tem um apartamento, e não volta nunca mais! É o Chico. É o Brasil.

Os jornais colocavam receitas de pratos doces e salgados e diabinhos alados nos espaços censurados. Enquanto isso, nós estudantes, moradores de repúblicas, nos acostumamos a esconder livros proibidos em fundo falso de malas, no forro ou na estufa dos fogões. Se você é jovem e está lendo isso, jamais queira viver e conhecer um estado policial.

Quando Geisel e Figueiredo começaram a abrir, o que “eles” fizeram? Mataram o jornalista Vladimir Herzog nas dependências do Doi-Codi, em São Paulo. Depois vieram as bombas enviadas aos desafetos do regime pelos Correios em pardos envelopes; uma senhora da OAB, se não me engano, morreu ao abrir um deses envelopes: outras bombas foram colocadas em bancas de revistas. Mas a gente venceu. É NÓIS!

(Com um triste adendo: quando derrubamos a censura, restauramos a democracia e as liberdades civis – sabe o que o povo brasileiro fez? Elegeu o Collor presidente...).

Concluo dizendo que o jornalismo impresso do Brasil tinha um caráter crítico e formador, sim. Capaz de nortear uma boa opinião pública. Mas até hoje o brasileiro não tem o hábito diário de ler.

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Durvalino Couto é publicitário - nas redes sociais. 

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