Ecos, de Eduardo Galeano, em Bocas do Tempo, mas eu daria o título de Ecos da tortura na ditadura:
Foi-se embora, mas ficou. Frei Tito estava livre, exilado na França, mas continuava preso no Brasil. Os amigos diziam a ele o que os mapas diziam, que o país de seus verdugos estava longe, do outro lado do oceano, mas aquilo não adiantava nada: ele era o país onde seus verdugos viviam.
Estava condenado à repetição cotidiana de seu inferno. Tudo o que tinha acontecido com ele tornava a acontecer. Durante mais de três anos, seus torturadores não deram trégua. Fosse aonde fosse, nos conventos de Paris e de Lyon ou nos campos do sul da França, davam chutes em seu ventre e golpes de cabo de fuzil na sua cabeça, apagavam cigarros em seu corpo nu e metiam a máquina de choques elétricos nos seus ouvidos e na sua boca.
E não se calavam nunca. Frei Tito havia perdido o silêncio. Em vão buscava algum lugar, algum canto do templo ou da terra, onde não soassem aqueles gritos atrozes que não o deixavam dormir, nem o deixavam rezar suas orações que antes haviam sido seu ímã de Deus.
E não aguentou mais. "É melhor morrer do que perder a vida", foi a última coisa que escreveu.
Quem foi Frei Tito de Alencar Lima?
O frade católico brasileiro assumiu a direção da Juventude Estudantil Católica em 1963 e foi morar no Recife. Mudou-se para São Paulo para estudar Filosofia na Universidade de São Paulo (USP). Em outubro de 1968, foi preso por participar do 30º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) em Ibiúna (SP). Fichado pela polícia, tornou-se alvo de perseguição pela repressão militar.
Preso em novembro de 1969, em São Paulo, acusado de oferecer infraestrutura a Carlos Marighella, Tito foi submetido à palmatória e choques elétricos, no Departamento de Ordem Política e Social (Dops). Em fevereiro do ano seguinte, quando já se encontrava em mãos da Justiça Militar, foi retirado do Presídio Tiradentes e levado para a sede da Operação Bandeirantes (Oban).
Durante três dias, bateram sua cabeça na parede, queimaram sua pele com brasa de cigarros e deram-lhe choques por todo o corpo, em especial na boca, “para receber a hóstia”. Os algozes queriam que Tito denunciasse quem o ajudara a conseguir o sítio de Ibiúna para o congresso da UNE e assinasse depoimento atestando que dominicanos haviam participado de assaltos a bancos. Tito tentou o suicídio e foi socorrido a tempo no hospital militar, no bairro do Cambuci.
Na prisão, escreveu sobre a sua tortura. O documento correu pelo mundo e se transformou em símbolo da luta pelos direitos humanos. Em dezembro de 1970, incluído na lista de presos políticos trocados pelo embaixador suíço Giovanni Bucher, sequestrado pela Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), Tito foi banido do Brasil pelo governo Médici e seguiu para o Chile. Sob a ameaça de novamente ser preso, fugiu para a Itália. De Roma, foi para Paris, onde recebeu apoio dos dominicanos. Traumatizado pela tortura, Frei Tito submeteu-se a um tratamento psiquiátrico. Nas ruas da capital francesa, ele “viu” o espectro de seus torturadores e cometeu suicídio.
No dia 10 de agosto de 1974, um morador dos arredores de Lyon encontrou o corpo de Frei Tito suspenso por uma corda pendurada em uma árvore. Foi enterrado no cemitério dominicano do Convento Sainte-Marie de La Tourette, em Éveux.
Em 1983, o corpo de Frei Tito chegou ao Brasil. Cercado por bispos e um numeroso grupo de sacerdotes, Dom Paulo Evaristo Arns repudiou a tragédia da tortura em missa de corpo presente, acompanhada por mais de 4 mil pessoas. A missa foi celebrada em trajes vermelhos, usados em celebrações de mártires.
Foi-se embora, mas ficou. Frei Tito estava livre, exilado na França, mas continuava preso no Brasil. Os amigos diziam a ele o que os mapas diziam, que o país de seus verdugos estava longe, do outro lado do oceano, mas aquilo não adiantava nada: ele era o país onde seus verdugos viviam.
Estava condenado à repetição cotidiana de seu inferno. Tudo o que tinha acontecido com ele tornava a acontecer. Durante mais de três anos, seus torturadores não deram trégua. Fosse aonde fosse, nos conventos de Paris e de Lyon ou nos campos do sul da França, davam chutes em seu ventre e golpes de cabo de fuzil na sua cabeça, apagavam cigarros em seu corpo nu e metiam a máquina de choques elétricos nos seus ouvidos e na sua boca.
E não se calavam nunca. Frei Tito havia perdido o silêncio. Em vão buscava algum lugar, algum canto do templo ou da terra, onde não soassem aqueles gritos atrozes que não o deixavam dormir, nem o deixavam rezar suas orações que antes haviam sido seu ímã de Deus.
E não aguentou mais. "É melhor morrer do que perder a vida", foi a última coisa que escreveu.
Quem foi Frei Tito de Alencar Lima?
O frade católico brasileiro assumiu a direção da Juventude Estudantil Católica em 1963 e foi morar no Recife. Mudou-se para São Paulo para estudar Filosofia na Universidade de São Paulo (USP). Em outubro de 1968, foi preso por participar do 30º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) em Ibiúna (SP). Fichado pela polícia, tornou-se alvo de perseguição pela repressão militar.
Preso em novembro de 1969, em São Paulo, acusado de oferecer infraestrutura a Carlos Marighella, Tito foi submetido à palmatória e choques elétricos, no Departamento de Ordem Política e Social (Dops). Em fevereiro do ano seguinte, quando já se encontrava em mãos da Justiça Militar, foi retirado do Presídio Tiradentes e levado para a sede da Operação Bandeirantes (Oban).
Durante três dias, bateram sua cabeça na parede, queimaram sua pele com brasa de cigarros e deram-lhe choques por todo o corpo, em especial na boca, “para receber a hóstia”. Os algozes queriam que Tito denunciasse quem o ajudara a conseguir o sítio de Ibiúna para o congresso da UNE e assinasse depoimento atestando que dominicanos haviam participado de assaltos a bancos. Tito tentou o suicídio e foi socorrido a tempo no hospital militar, no bairro do Cambuci.
Na prisão, escreveu sobre a sua tortura. O documento correu pelo mundo e se transformou em símbolo da luta pelos direitos humanos. Em dezembro de 1970, incluído na lista de presos políticos trocados pelo embaixador suíço Giovanni Bucher, sequestrado pela Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), Tito foi banido do Brasil pelo governo Médici e seguiu para o Chile. Sob a ameaça de novamente ser preso, fugiu para a Itália. De Roma, foi para Paris, onde recebeu apoio dos dominicanos. Traumatizado pela tortura, Frei Tito submeteu-se a um tratamento psiquiátrico. Nas ruas da capital francesa, ele “viu” o espectro de seus torturadores e cometeu suicídio.
No dia 10 de agosto de 1974, um morador dos arredores de Lyon encontrou o corpo de Frei Tito suspenso por uma corda pendurada em uma árvore. Foi enterrado no cemitério dominicano do Convento Sainte-Marie de La Tourette, em Éveux.
Em 1983, o corpo de Frei Tito chegou ao Brasil. Cercado por bispos e um numeroso grupo de sacerdotes, Dom Paulo Evaristo Arns repudiou a tragédia da tortura em missa de corpo presente, acompanhada por mais de 4 mil pessoas. A missa foi celebrada em trajes vermelhos, usados em celebrações de mártires.
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