No final da remota década de 1960, um punhado de deserdados acoitava-se num casarão esquisito denominado “cangalha”. Eu estava entre eles. Éramos todos muito pobres, quase todos semianalfabetos e estávamos na capital para estudar. O casarão fora alugado pelo CCEP justamente para nos abrigar. Ficava na R. Simplício Mendes, já na Baixa do Chicão. A rua acabava ali. O que vinha depois era um terreno baldio cortado por um esgoto a céu aberto.
Um dia, resolvemos transformar aquela lixeira num campinho de futebol. Juntamos a cabroeira, e o “campo”, enviesado, troncho, com traves de talos de babaçu, ficou pronto. O esgoto dividia o “campo”. Montamos três times. Para fazer jus ao local, batizamos as equipes com nomes insólitos: Vírus, Bactéria e Bacilo. Como em qualquer pelada que se preze, só existia uma regra: “do pescoço pra baixo, tudo é canela”. Terminávamos as refregas completamente lambuzados de lama. Até onde a memória alcança, não me lembro de ninguém que tenha morrido contaminado.
O Bacilo venceu o torneio, e o troféu foi um pedaço de telha no qual se lia CARNIÇA. Decididamente, pobre sobrevive a tudo. Aqui estou, ainda meio vivo, para contar a história.
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Cineas Santos é professor, escritor, poeta e produtor cultural - nas redes sociais.
Um dia, resolvemos transformar aquela lixeira num campinho de futebol. Juntamos a cabroeira, e o “campo”, enviesado, troncho, com traves de talos de babaçu, ficou pronto. O esgoto dividia o “campo”. Montamos três times. Para fazer jus ao local, batizamos as equipes com nomes insólitos: Vírus, Bactéria e Bacilo. Como em qualquer pelada que se preze, só existia uma regra: “do pescoço pra baixo, tudo é canela”. Terminávamos as refregas completamente lambuzados de lama. Até onde a memória alcança, não me lembro de ninguém que tenha morrido contaminado.
O Bacilo venceu o torneio, e o troféu foi um pedaço de telha no qual se lia CARNIÇA. Decididamente, pobre sobrevive a tudo. Aqui estou, ainda meio vivo, para contar a história.
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