Ao longo da vida, fiz uma meia duzia de entrevistas com Maria da Inglaterra . Em todas elas, ouvi a mesma história: morando no interior de Buriti dos Lopes, certa noite, viu uma luz intensa que se aproximava do terreiro da casinha onde morava. Assustado, Otacílio escondeu-se no interior da casa. Maria permaneceu na janela e viu descerem da luz duas crianças (Joãozinho e Diana) que, a partir de então, tornaram-se seus "guias". Repetia a história com tal convicção que era impossível duvidar de sua veracidade.

Os "guias" ensinaram Maria Luíza dos Santos Silva a compor e a cantar. Analfabeta, cantava para Otacílio que escrevia as letras das canções. O mais é do conhecimento de todos: ao ouvi-la cantar, pesquisador Ricardo Cravo Albim "batizou-a" com o nome artístico Maria da Inglaterra.

Segundo seus cálculos, compôs mais de duas mil canções, algumas delas gravadas por grandes nomes da música piauiense. A composição mais famosa, "E o peru rodou", nasceu no dia em que ouviu, no rádio, a notícia da morte, num desastre aéreo, do cantor Agostinho dos Santos (12/07/73).

Na última entrevista que fiz com Maria, ela resumiu toda a sua trajetória com incrível poder de síntese: "Os meninos disseram que eu ia sofrer muito, mas ia vencer tudo.E quando eu subisse na vida, tinha de passar um ano na Praia de Boa Viagem, no Recife". Fez uma pausa e, com um sorriso triste, finalizou: "O problema é que nunca subi na vida. A vida e que vive subida em mim".

Com o silêncio da "Rainhas da canções", morre a inocência na música popular do piauiense.

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Cineas Santos é professor, escritor, poeta e produtor cultural - nas redes sociais.