Ninguém lhe sabia o nome verdadeiro, a procedência, a idade. Chamavam-no véi Pimpim. Sabia-se, contudo, que era benzedor, curador e catimbozeiro. O cheiro o denunciava à distância: rescendia a tipi, uma “erva poderosa”.
Morava num casebre num ponto equidistante entre a Rua de Baixo e o Gavião. A casinha era protegida por uma paliçada de galhos espinhentos. No pequeno quintal, imperava um umbuzeiro generoso. Nem os moleques mais afoitos ousavam furtar-lhe um umbu. Era negro, muito velho, temido. “Tem pauta com o tinhoso”, afirmavam.
Pelo menos duas vezes por semana, passava na casa da Matriarca. Vinha sempre arrastando um galho de árvore. Mal o avistava, a irmã arteira, pegava um punhado de penas de galinha e jogava na entrada da casa. Ao ver a penas, o velho recuava, benzia-as com a ponta do bastão e, só então, entrava, nunca deixando de advertir: “Tem coisa ruim rondando esta casa”. Carregava, num embornal de fibra de caroá, 18 tabaqueiros feitos de chifres de boi, de bode, de carneiro, com rapés para todas as versidades de doenças. Didaticamente, explicava: “Se cheirar este, cai e só se levanta com este...”
Dona Purcina servia-lhe uma caneca d’água e um cafezinho. O velho bebia lentamente. Depois, agradecia: “Deus lhe acrescente, senhora dona”. A irmã atiçada provocava: “Está com fome, seu Pimpim?”. “Que pergunta, dona menina. E ela me deixa passar fome?”. “Ela quem, seu Pimpim?”. “O nome dela eu num digo. É a dona do mato, das caças, dos bichos, de tudo...”. A irmã provocava: “É a Caipora?”. “Num fale o nome dela. Ela se ofende!”. Cafungava um pouco de rapé e prosseguia: “ Já me chamou pra morar no palácio dela... Tem de um tudo...”
Antes de retirar-se, oferecia rapé de mulatinha aos presentes e, dedo em riste, afirmava: “Só num joguei ainda uma bomba tônica nesta cidade por causa de três pessoas: o dotô Abílio, o major Mané Carlos e dona Purcina”. E, manquitolando, seguia rumo ao casebre, deixando no ar um rastro de poeira e tipi...
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Cineas Santos é professor, escritor, poeta e produtor cultural.
Morava num casebre num ponto equidistante entre a Rua de Baixo e o Gavião. A casinha era protegida por uma paliçada de galhos espinhentos. No pequeno quintal, imperava um umbuzeiro generoso. Nem os moleques mais afoitos ousavam furtar-lhe um umbu. Era negro, muito velho, temido. “Tem pauta com o tinhoso”, afirmavam.
Pelo menos duas vezes por semana, passava na casa da Matriarca. Vinha sempre arrastando um galho de árvore. Mal o avistava, a irmã arteira, pegava um punhado de penas de galinha e jogava na entrada da casa. Ao ver a penas, o velho recuava, benzia-as com a ponta do bastão e, só então, entrava, nunca deixando de advertir: “Tem coisa ruim rondando esta casa”. Carregava, num embornal de fibra de caroá, 18 tabaqueiros feitos de chifres de boi, de bode, de carneiro, com rapés para todas as versidades de doenças. Didaticamente, explicava: “Se cheirar este, cai e só se levanta com este...”
Dona Purcina servia-lhe uma caneca d’água e um cafezinho. O velho bebia lentamente. Depois, agradecia: “Deus lhe acrescente, senhora dona”. A irmã atiçada provocava: “Está com fome, seu Pimpim?”. “Que pergunta, dona menina. E ela me deixa passar fome?”. “Ela quem, seu Pimpim?”. “O nome dela eu num digo. É a dona do mato, das caças, dos bichos, de tudo...”. A irmã provocava: “É a Caipora?”. “Num fale o nome dela. Ela se ofende!”. Cafungava um pouco de rapé e prosseguia: “ Já me chamou pra morar no palácio dela... Tem de um tudo...”
Antes de retirar-se, oferecia rapé de mulatinha aos presentes e, dedo em riste, afirmava: “Só num joguei ainda uma bomba tônica nesta cidade por causa de três pessoas: o dotô Abílio, o major Mané Carlos e dona Purcina”. E, manquitolando, seguia rumo ao casebre, deixando no ar um rastro de poeira e tipi...
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Cineas Santos é professor, escritor, poeta e produtor cultural.
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