O futebol é muito mais do que o Brasileirão, a Champions League, a Copa do Mundo. Aí se reúnem clubes e seleções do alto da pirâmide social do esporte. A cultura do vitorioso estabelece que você deve escolher campeões para vestir a camisa e torcer. Eu venho me tornando um torcedor "poeta Manoel de Barros". Aprecio as insignificâncias. 

Qualquer Íbis me faz sorrir com suas raríssimas vitórias. Faço mais. Gosto de parar para ver peladeiros. Eles são Garrinchas, Pelés, Jairzinhos, Tostões, Gersons, Zicos, Reinaldos, Ronaldos, Neymares, Leões, Alissons que ficaram nos campos de poeira e de várzea. Suas jogadas, dribles, gols e defesas não serão vistos por olheiros. Ainda que muitos sonhem em se tornar fenômenos internacionais. 

Exagero em fazer dos peladeiros craques sem oportunidade? Sim, por "culpa" de Manoel de Barros. Que lindeza me chega em "O apanhador de desperdícios": 

"...Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes...
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios..."



E que maravilhas encontrei em "Sobre importâncias". Muito me serviu, porque sou um fotógrafo semelhante aos craques do poeirão:

"Um fotógrafo-artista me disse outra vez: veja que pingo de sol no couro de um lagarto é para nós mais importante do que o sol inteiro no corpo do mar. Falou mais: a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balanças nem com barômetros etc. Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produz em nós..."



Que coisa mais importante a pelada que assisti com os amigos de Esperantina (Piauí), Elias Medeiros Júnior e Joao Paulo Aguiar, no campo da Binga, lá no antigo bairro Batista de Amorim. Nós, entre uma talagada de conversa e outra, na beira do "gramado", a ver meninos criarem jogadas que televisão nenhuma viu e mostrou. Mas nós vimos e torcemos e demos notas aos craques e só não gritamos "juiz ladrão" porque não havia juiz. Nem ladrão. Só meninos magicamente descalços atrás da bola.

Crônica e imagens: Mauro Sampaio