No bairro Aldeia, em São Raimundo Nonato, há um santuário modernoso (leia-se feioso) onde se cultua Nossa Senhora das Mercês. Foi construído no local onde havia um capelinha de linhas neoclássicas e torre aguda. Era pequena, bela, acolhedora. No altar, a Virgem das Mercês, de olhar compassivo, derramava graças sobre a gente pobre do bairro. No período das novenas, ofertávamos flores cantando: "Ó vinde, vamos todos/ com flores à porfia...". Ninguém sabia o significado da palavra porfia, mas devia ser algo bom...
Por falta de flores "nobres", eu ofertava flores de canafístula, colhidas nos monturos. Flores amarelas, belas, perfumadas. Um dia, uma das beatas me recriminou: "Não traga mais isso para a Virgem". Entendi o recado: não traga flores pobres...
Dia desses, visitei o santuário e lá estava a mesma Virgem ladeada por dois anjos atentos. No rosto de menina triste, o mesmo olhar compassivo. Infelizmente, eu já nem tinha flores de monturo para ofertar. Limitei-me a olhar aquela imagem antiga que, na meninice, me encantava. Antes de retira-me, olhei-a novamente e tive a impressão de vê-la esboçar um leve sorriso , um sorriso de cumplicidade. Retirei-me bastante aliviado...
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Cineas Santos é professor, escritor, poeta e produtor cultural - nas redes sociais.
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