Se vivo fosse, João Cabral de Melo estaria completando neste mês (dia 9 de janeiro) 104 anos de idade. João, além de uma dor de cabeça intermitente, não gostava de música; não gostava de barulho, não gostava de elogios. Gostava de futebol (foi campeão juvenil pelo Santa Cruz); de touradas, de poesia. No trato com as palavras, era rigoroso e certeiro.
Vamos homenageá-lo com um poema que o representa:
O SERTANEJO FALANDO
1.
A fala a nível do sertanejo engana:
as palavras dele vêm, como rebuçadas
(palavras confeito, pílula), na glace
de uma entonação lisa, de adocicada.
Enquanto que sob ela, dura e endurece
o caroço de pedra, a amêndoa pétrea,
dessa árvore pedrenta (o sertanejo)
incapaz de não se expressar em pedra.
2.
Daí porque o sertanejo fala pouco:
as palavras de pedra ulceram a boca
e no idioma pedra se fala doloroso;
o natural desse idioma fala à força.
Daí também porque ele fala devagar:
tem de pegar as palavras com cuidado,
confeitá-la na língua, rebuçá-las;
pois toma tempo todo esse trabalho'
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Cineas Santos, professor, escritor, poeta e produtor cultural - nas redes sociais.
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