A comissão especial do Congresso que analisa a medida provisória do Código Florestal aprovou ontem uma emenda que poderá comprometer para sempre todas as bacias hidrográficas brasileiras. Por 15 votos a 12, a comissão decidiu que só serão resguardados por Área de Proteção Permanente (APP) os rios perenes. Os intermitentes, que correspondem a mais da metade dos rios piauienses, poderão virar pasto, roça e estrada.
Pelas contas do senador Jorge Viana (PT-AC), 50% dos rios brasileiros serão atingidos. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, 80% dos rios do Piauí são intermitentes e no Distrito Federal, 70%. Entre os rios que poderão perder a proteção está até o Jaguaribe, em cujos leitos se encontram os Açudes do Castanhão e de Orós, no Ceará. Há épocas do ano em que o Jaguaribe seca."Os rios intermitentes é que mandam a água para os perenes. Sem eles, todas as bacias hidrológicas ficarão comprometidas", afirmou Viana.
"Um rio que seca parte do ano, se não estiver protegido, com o tempo pode não voltar mais. Uma decisão dessas está no fundo sacrificando rios e, em última instância, sacrificando o fornecimento de água", disse Ana Cristina Barros, da ONG TNC, que trabalha com projetos de plantio em margens de rios para garantir a produção de água.
A emenda que tirou a proteção dos rios intermitentes foi apresentada pelo deputado Abelardo Lupion (DEM-PR). Segundo ele, o objetivo foi dar "maior clareza à lei e buscar um tratamento isonômico com os olhos d'água perenes". Para Viana, não sobrarão nem os igarapés da Amazônia, que em determinadas épocas do ano são gigantescos braços de água e em outros secam.
Independentemente do mérito, a proposta acabou gerando indignação da base aliada ao governo na comissão, por ir contra um entendimento que havia de não se apresentar nenhuma coisa nova ao texto já acordado.
O relator da MP na comissão especial, senador Luiz Henrique (PMDB-SC) já havia estabelecido que não se apreciaram assuntos já decididos anteriormente na Câmara e no Senado. Por conta disso, decidiu-se suspender a discussão. A comissão mista só volta a se reunir agora no dia 28.
Áreas úmidas. Na sessão de ontem, os ambientalistas perderam nessa questão, mas ganharam a votação que manteve a proteção às áreas úmidas. Uma emenda dos ruralistas pretendia tirar da lei a definição do que é área úmida, sob o argumento de que, com o resguardo a elas, não seria mais possível plantar arroz em ilhas gigantes da Amazônia, no Vale do Araguaia e charqueados gaúchos. Feita a votação, houve empate de 13 a 13. O presidente da comissão, deputado Bohn Gass (PT-RS), desempatou a favor das áreas úmidas.
Em outro acordo entre as partes, ficou estabelecido que o prazo máximo para a suspensão de plantio em áreas que necessitam de repouso (o chamado pousio) será de cinco anos. O consenso foi possível porque o relator tirou do texto o limite de 25% para o repouso. Os ruralistas argumentaram que ficaria fácil para os órgãos fiscalizadores dizer que determinada área não era produtiva, tornando a área passível de desapropriação para a reforma agrária. Os ruralistas, no entanto, conseguiram tirar a parte que autorizava o governo a desapropriar propriedades com áreas extensas abandonadas, não usadas para a produção.
A MP foi editada em maio pela presidente Dilma Rousseff, depois de ela vetar pontos da lei que reformou o Código. O texto-base foi aprovado em julho, mas faltaram ser votadas 343 propostas de mudanças no documento. Um acordo ontem já retirou cerca de 300 emendas.
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