Integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) que assaltam bancos no Nordeste, onde distribuem armas e drogas para traficantes locais. Tabletes de maconha apreendidos com a sigla do “Partido do Crime” em cidades de Minas Gerais. Assaltantes de caixa eletrônico “batizados” em presídios de Santa Catarina e, posteriormente, treinados por comparsas paulistas. Os casos relatados acima são alguns exemplos recentes dos tentáculos do maior e mais organizado grupo criminoso do Brasil além das fronteiras de São Paulo. O último episódio foi uma rebelião na Casa de Custódia de Teresina, no Piauí, ocorrido na semana passada. O líder, José Ivaldo Celestino dos Santos, é membro do PCC, segundo o secretário de Justiça do Piauí, Henrique Rebelo, que já tentou, sem sucesso, transferi-lo para um presídio federal. Um levantamento realizado pelo procurador paulista Márcio Sérgio Christino mostra as digitais da facção em dezenas de processos criminais existentes em tribunais de norte a sul do País. “Os documentos são uma indicação de ações do PCC em outros Estados”, diz o procurador, especialista em combate ao crime organizado.
A principal forma de aproximação entre integrantes da facção paulista e criminosos de outros Estados é a convivência no sistema penitenciário. No Maranhão, por exemplo, foi criado o Primeiro Comando do Maranhão (PCM) nas prisões estaduais. “Isso aconteceu depois que presos maranhenses em presídios federais estabeleceram relações com membros do PCC”, diz Aluísio Mendes, secretário de Segurança Pública do Maranhão. Há dois anos, 18 integrantes do PCM são mantidos em isolamento. Há três semanas, Ivo Maranhão e Gustavo Alves Feitosa, ambos integrantes da facção paulista, foram presos na cidade de Imperatriz (MA), após uma série de roubos em agências bancárias no Pará, Tocantins e Piauí. Com essa aproximação, nos últimos anos surgiram espécies de franquias do crime, a exemplo da Comissão da Paz, na Bahia, ou Al-Qaeda, na Paraíba. Não significa que o PCC domina o submundo desses locais, e sim que exerce influência por meio de parcerias criminosas. Somente este ano, operações da Polícia Federal prenderam membros da quadrilha no Acre, Pará e em Mato Grosso do Sul.
Os primeiros sinais de expansão do PCC foram detectados oficialmente na CPI do Tráfico de Armas, em 2006, quando surgiu a informação de que o líder do grupo, Marcos Williams Herbas Camacho, o Marcola, havia designado o traficante Sidnei Romualdo, paraibano criado em Diadema (SP), para liderar as ações no Nordeste. Ele foi preso em Pernambuco, mas a expansão não se deteve.
Sentenças de desembargadores alagoanos mostram que nos últimos três anos seis bandidos do PCC foram transferidos de Alagoas para presídios federais. É o caso de Luciano Soares da Rocha, que comandava o tráfico em União dos Palmares (AL), e está preso há três anos. Além disso, uma decisão do tribunal do Rio Grande do Norte afirma que o traficante Olívio Bezerra Queiroz, detido no ano passado, associou-se a um tesoureiro do PCC para chefiar uma quadrilha interestadual de tráfico de entorpecentes com atuações também no Ceará e na Paraíba.
“Os atentados em São Paulo em 2006 fizeram com que o PCC ganhasse prestígio pelo País, mas há lugares onde a influência é nula, como no Rio de Janeiro”, diz Guaracy Mingardi, que coordenou por oito anos o setor de Inteligência do Ministério Público e é ex-subsecretário Nacional da Segurança Pública. “A presença é mais sólida nas cadeias do Paraná, de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, Estados essenciais para controle de rotas de tráfico de drogas e armas.” Como controla boa parte do comércio de entorpecentes em São Paulo, onde estão os aeroportos, rodovias e porto mais movimentados do País, o PCC é o fornecedor principal das quadrilhas nordestinas. “A chegada de pasta de coca à Bahia e sua distribuição para os traficantes passa, invariavelmente, por membros ligados ao PCC”, afirma o promotor Ariovaldo Figueiredo, chefe do grupo de combate ao crime organizado do MP baiano. Na própria disputa por venda de drogas no Estado há digitais paulistas. “Facções criminosas locais, inclusive com apoio do PCC, travam uma guerra urbana e o resultado pode ser contabilizado numa sangrenta matança”, afirma Figueiredo. O número de homicídios na Bahia aumentou mais de 450%, no período 1999-2010, segundo o Mapa da Violência, do Instituto Sangari.
Existe outra modalidade de aproximação entre o PCC e a bandidagem local: o ensinamento de técnicas criminosas por especialistas de São Paulo. Em maio, o líder de uma quadrilha de assaltantes de caixas eletrônicos em Santa Catarina, José Luiz Freitas, 34 anos, recebeu treinamento de colegas paulistas em um sítio em Itajaí. Obteve também armamento, munição e o TNT em gel para explodir os terminais. Freitas entrou para o grupo há quatro anos. “Parte do dinheiro arrecadado nas ações, que variava de 40% a 50% do valor de cada roubo, era enviado ao PCC”, diz o delegado Diego Azevedo, que o prendeu. Em Santa Catarina, documentos da Justiça estadual revelam que foi criado, há pelo menos sete anos, o Primeiro Grupo Catarinense, ligado à cúpula do PCC.
Por mais que seja minimizada pelas autoridades da segurança pública de São Paulo, a ascensão do PCC ainda se concentra em território paulista, onde está presente em pelo menos 123 cidades, segundo documentos em posse do Ministério Público. Mas sua expansão causa preocupação a autoridades de outros Estados. ISTOÉ apurou que as polícias de Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e São Paulo trocam informações frequentes sobre o grupo. O Conselho de Secretários de Segurança do Nordeste, por sua vez, já debateu a presença do PCC na região. “A colaboração tem sido intensiva para evitar que o PCC seja tão forte quanto é em São Paulo”, diz o secretário do Maranhão, Aluísio Mendes.
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