Entre os anos de 1996 e 1997, Júlio Medeiros, arquiteto teresinense, ao lado de uma equipe multidisciplinar, restaurou o Teatro, o Clube dos Diários e a Praça Pedro II, em um projeto denominado por ele, de Corredor Cultural. Em todos os equipamentos mencionados procurou priorizar a originalidade com o objetivo de fazer Teresina reviver e valorizar sua memória urbana. Famílias doaram ou emprestaram fotos antigas para que os profissionais envolvidos no projeto pudessem seguir o desenho original. As poucas intervenções contemporâneas ficaram por conta dos artistas plásticos que foram convidados a agregar valor ao patrimônio com suas obras, em geral belas e discretas, como a da Fátima Campos, situada no canteiro lateral do Teatro, hoje já precisando de restauro.
Na praça Pedro II o retorno ao passado trouxe a rua transversal que a divide, que assim como a rua que fica em frente ao Teatro 4 de Setembro, foi desde a reforma da década de 1990, conservada fechada para a passagem de qualquer tipo de veículo. Assim, preservava-se a originalidade e ao mesmo tempo priorizava-se o pedestre e revigorava-se mais um espaço para a convivência cultural urbana, sem a interrupção do invasor automóvel.
Recentemente uma discussão sobre a pretensão dos empresários teresinenses de fazer gestão frente ao poder público para abrir a rua em frente ao Teatro, ganhou as redes sociais como também levou artistas e defensores do patrimônio a se unir em manifestações contrárias.
As justificativas para a abertura da rua vão desde a necessidade de mais uma via de fluxo para os carros, como também a possibilidade de mais espaço para estacionamento. Tudo isso, como se a abertura de um quarteirão pudesse diminuir a crise em que se encontram os lojistas do centro de Teresina.
Tenho certeza de que as consultorias em que devem ter investido muito dinheiro, devem ser bem competentes; então aqui só nos resta, trazer argumentos contrários embasados em exemplos por todo o mundo, e quem sabe despertar para as possibilidades mercadológicas que podem surgir, não com a abertura de um quarteirão, mas com o fechamento de outras tantas ruas, no modelo da Rua Climatizada, ou, quem sabe com ruas compartilhadas, em que o espaço do carro seja reduzido e o do pedestre aumentado, ao mesmo tempo ou em horários determinados.
Em 2014, o ICC - Instituto de Comunicação e Cultura ao lado do IAB - Instituto dos Arquitetos do Brasil- Piauí e do CAU - Conselho de Arquitetura e Urbanismo-PI realizou o IV Teresina Sustentável–Ação centro. Foram realizados três encontros com especialistas, lojistas, arquitetos, artistas e comunidade em geral que debateram quatro principais eixos temáticos: Moradia no centro da cidade; Economia Criativa; Mobilidade, e,Cultura. Todos integrados e articulados entre si. Impossível pensar a potencialização do uso dos equipamentos culturais do centro de Teresina sem impulsionar a economia criativa, a moradia e a mobilidade urbana. E vice-versa.
É certo que o cliente tem se afastado das lojas do centro da cidade, mas não acredito que seja porque faltam estacionamentos, já que se derrubam casas do nosso patrimônio, quase todos os dias para que sejam criados locais para guardar carros.
Acredito que os motivos que afastam o cidadão do centro são vários, mas destacarei somente três: 1. Sensação de insegurança; 2. Ausência de condições para a mobilidade do pedestre nas ruas aonde se localizam as lojas; 3. Ausência total de conforto para os clientes que transitam pelas ruas do centro.Vale lembrar que esses três pontos foram resolvidos pelo modelo dos centros comerciais que atraem grandes levas de pessoas, sobretudo, em nossa cidade cujo clima normalmente é bem quente. Como então competir com os shoppings centers?
1. No item segurança, vivenciamos na zona centralum estado de eterna vigilância. De uma hora para outra, a sua bolsa, o seu celular, o seu carro ( etc.) podem ser roubados, sem contar no risco de violência física. Isso nos levaa demorar o mínimo possível no centro da cidade. Assim só vai ao centro quem tem negócios que só podem ser realizados ali. O que é possível fazer então? – Sugestões: Pode-se tanto realizar parcerias com o poder público para o reforço do policiamento com o compartilhamento dos custos; como investir em segurança própria para cada quarteirão do centro da cidade. A instituição que representa os lojistas (CDL) pode muito bem fazer a contratação e dividir os custos entre todos os interessados. Os frutos serão colhidos com o retorno do cliente, que ao perceber a nova situação, voltará a frequentar as lojas.
2. Sobre a mobilidade urbana,a questão é tão séria como a da segurança. Em setembro e outubro passado estive duas vezescom pequenos grupos visitando os pontos turísticos do centro de Teresina. A caminhada sempre é muito difícil. Em primeiro lugar calçadas muito estreitas, todas esburacadas, acompanhadas por esgotos a céu aberto. Nós, assim como, qualquer pedestre, ficávamos disputando alguma ponta do asfalto ao lado dos esgotos; isso quando os carros davam uma folga.
3. Já o conforto para fazer compras no centro é quase inexistente. Não existem árvores nas ruas que possam diminuir o calor, só existe uma rua climatizada, que não está mais climatizada ( mas deve passar por reforma se o MISPI-Museu da Imagem e do Som e Pinacoteca vier a ser construído mesmo). Não existem bancos nas ruas para que as pessoas possam descansar. Algumas praças como a Pedro II estão em estado de abandono, com canteiros sem cuidados e inúmeras lâmpadas quebradas.
O que é possível então se fazer para solucionar os dois últimos pontos relacionados? Sugestões: _ Fechar algumas ruas aumentando a área dos calçadões e climatizando quando possível, compartilhar outras ruas reduzindo o espaço do carro e criando áreas de convivência para o cidadão, com a plantação de árvores que possam proporcionar áreas sombreadas, assim como, possibilitando a criação de canteiros. De modo que em todas as ruas do centro de Teresina seja possível caminhar com tranquilidade para que o cidadão que vai ao centro realizar compras, possa olhar as vitrines, os produtos, verificar os preços e escolher aonde e quando deseja comprar algum produto. Impossível admirar vitrines arriscando ser atropelado, cair num buraco ou ser assaltado.
Entretanto, se a postura dos empresários for continuar tratando os clientes sem nenhum respeito, será bem difícil reverter o quadro e com certeza não será a abertura de um quarteirão que vai resolver o problema do comércio de Teresina.
Várias vezes escrevi nesta coluna, sobre o pensar Teresina como um projeto de cultura. Durante o Teresina Sustentável de 2014 falei para alguns empresários quecuidar do patrimônio, preservar a memória urbana e incentivar as manifestações culturais só agrega valor aos negócios. Todos os grandes centros de cidades que possuem capital cultural reconhecido em todo o mundo, são preservados, cuidados e valorizados por seus habitantes, pois carregam seu diferencial de lugar e de povo. Nenhuma loja possui capital cultural agregado e atrai mais pessoas do que uma simples casa de cultura. Vamos pensar melhor! Fica a dica !
Ana Regina Rêgo
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