Naquele quase não lugar, as meninas do meu tope eram poucas e feitas. Como não havia referências, as coisas estavam conforme. Permaneceu assim por muito tempo. Perdurou até o dia do aparecimento de Lina. Era em tudo diferente. A pele clara, cabelos castanhos, vestido cor-de-rosa, sandálias de tirinhas e uma pequena fivela dourada prendendo os cabelos. De pronto, decidi que me casaria com ela. Nem me dei conta do abismo etário a nos separar: eu tinha uns oito anos de idade; ela teria uns dezessete.
Cometi a imprudência de revelar meu projeto à irmã amada. Um mês depois, Lina voltou ao Campo Formoso. A irmã arteira não se conteve: “Lina, este moço aqui disse que vai se casar contigo”. A moça desenhou na face o seu melhor sorriso e afirmou: “Pois trate de crescer logo para ganhar muito dinheiro. Manter uma mulher do meu naipe custa caro”. E voltou a sorrir. Triste e envergonhado, escondi-me para chorar.
Começava ali um novo sofrimento: todos os dias, encostava-me numa parece e pedia a uma das meninas para marcar a minha altura com um pedaço de carvão. Descobri, desacorçoado, que crescer não depende da gente. Era urgente crescer e ir a São Paulo ganhar dinheiro graúdo...
O tempo e os contratempos nos separaram. Lina casou-se, filhou, envelheceu... Quanto a mim, catapultado por dona Purcina, caí numa cidade grande onde criei raízes, plantei muito, colhi pouco, envelheci...
Dia desses, perambulando pelos sertões, aceitei o convite da irmã: “Vamos visitar uma amiga”. A amiga era dona Lina, uma senhora distinta, elegante, bonita. Ao me ver, não se conteve: “Eu não te enganei. Você demorou muito a crescer e havia outros pretendentes...” Para alegrar a prosa, afirmei: a proposta ainda está de pé. Com um sorriso maroto, arrematou: “Não era mesmo para acontecer: naquele tempo, você era muito novo; agora, está velho demais...”
Sem pressa, a tarde desceu sobre nós.
****
Cineas Santos é professor, escritor, poeta e produtor cultural - nas redes sociais.
Cometi a imprudência de revelar meu projeto à irmã amada. Um mês depois, Lina voltou ao Campo Formoso. A irmã arteira não se conteve: “Lina, este moço aqui disse que vai se casar contigo”. A moça desenhou na face o seu melhor sorriso e afirmou: “Pois trate de crescer logo para ganhar muito dinheiro. Manter uma mulher do meu naipe custa caro”. E voltou a sorrir. Triste e envergonhado, escondi-me para chorar.
Começava ali um novo sofrimento: todos os dias, encostava-me numa parece e pedia a uma das meninas para marcar a minha altura com um pedaço de carvão. Descobri, desacorçoado, que crescer não depende da gente. Era urgente crescer e ir a São Paulo ganhar dinheiro graúdo...
O tempo e os contratempos nos separaram. Lina casou-se, filhou, envelheceu... Quanto a mim, catapultado por dona Purcina, caí numa cidade grande onde criei raízes, plantei muito, colhi pouco, envelheci...
Dia desses, perambulando pelos sertões, aceitei o convite da irmã: “Vamos visitar uma amiga”. A amiga era dona Lina, uma senhora distinta, elegante, bonita. Ao me ver, não se conteve: “Eu não te enganei. Você demorou muito a crescer e havia outros pretendentes...” Para alegrar a prosa, afirmei: a proposta ainda está de pé. Com um sorriso maroto, arrematou: “Não era mesmo para acontecer: naquele tempo, você era muito novo; agora, está velho demais...”
Sem pressa, a tarde desceu sobre nós.
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