

Essa frase em latim deu origem a uma arma originada na Primeira Guerra Mundial, adotada pelo exército alemão, chamada Luger P08, 9 mm, semiautomática. Dois milhões de unidades foram fabricadas somente entre os anos de 1914 e 1918. A fama da Parabélum foi tão longe que chegou nas cinturas de dois grandes cangaceiros, Lampião e Corisco: “- Se entrega, Corisco! / - Eu não me entrego, não! / Não me entrego ao tenente / Não me entrego ao capitão / Eu me entrego só na morte / De Parabélum na mão”, dizem esses versos de uma música de Sérgio Ricardo. A arma foi mais longe e alcançou a cintura do tenente Florentino Cardoso, que em 1927 era Delegado de Polícia da cidade de Barras. Foi com ela que Florentino matou Gregório Pereira dos Santos, conhecido pelos devotos como Motorista Gregório, com um tiro no ouvido, no amanhecer de 17 de outubro. No meu livro “Parabélum” (Editora Nova Aliança), a morte de Gregório é assim descrita:
“Gregório encolheu-se assustado, sem imaginar que ouviria o estampido mais temido de toda a sua vida. Pareceu um traque das brincadeiras de São João em sua terra natal, quando corria pelas ruas com a garotada vizinha. A bala não demorou a atingir o alvo, que estava a pouca distância, à queima-roupa. Em frações de segundos aquele estalo seco prolongou-se pelo seu tímpano e espalhou-se pelo corpo, estremecendo a cabeça incrivelmente atônita. Penetrou pelo ouvido, rasgando caminho até perder-se pelas entranhas dos seus pensamentos. Foi um estampido ensurdecedor, rápido e indolor. Demonstrava a verdade de todos os seus temores. Ainda ouviu a mulher do tenente suplicar aos gritos pela sua vida. Todos os que presenciaram a cena clamaram para que o maldito estampido não ecoasse naquela manhã, mas não houve jeito. De repente, fez-se o silêncio, um zumbido distante substituiu as vozes à sua volta. Uma calma reinou sobre o seu corpo, ainda que a cabeça levasse um soco violento pelo impacto da bala.
Por um tempo imperceptível Gregório sentiu que todas as suas esperanças haviam se esvaído. Esperança de continuar a viver, de rever a família, de se dedicar mais à sua profissão, de sentir que não havia dúvidas sobre a sua inocência. As pernas enfraqueceram, o corpo cambaleou, a integridade desmoronou, a esperança se foi. Os joelhos curvaram-se para frente e tocaram o chão como se implorassem por uma última chance. O corpo não suportou o peso de tamanha injustiça praticada. Caiu de bruços, manchando de sangue o chão e a vida do tenente. O rosto de encontro à terra, o corpo revirado, a alma despedaçada, uma tragédia dissipada no ar desesperador daquela manhã. Os gritos, os choros, o desespero das testemunhas eram a maior prova do absurdo cometido. Findou-se uma vida em sua plenitude. Ceifaram-se as esperanças. Acabaram-se os sonhos, enterrou-se o futuro. Nada mais havia que trouxesse a harmonia de volta. Vingança, desespero, ódio, irracionalidade, preconceito racial. Muitas razões sobravam na mente do matador, mas poucas foram as chances da vítima. Só restou um corpo humilhado, sob os olhares pasmos dos que presenciaram a cena. Sete da manhã de 17 de outubro de 1927. Caiu morto, sem chances de defesa".
Nota: Si vis pacem, para bellum significa "Se queres a paz, prepare-se para a guerra"
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Eneas Barros é escritor piauiense, nas redes sociais.
“Gregório encolheu-se assustado, sem imaginar que ouviria o estampido mais temido de toda a sua vida. Pareceu um traque das brincadeiras de São João em sua terra natal, quando corria pelas ruas com a garotada vizinha. A bala não demorou a atingir o alvo, que estava a pouca distância, à queima-roupa. Em frações de segundos aquele estalo seco prolongou-se pelo seu tímpano e espalhou-se pelo corpo, estremecendo a cabeça incrivelmente atônita. Penetrou pelo ouvido, rasgando caminho até perder-se pelas entranhas dos seus pensamentos. Foi um estampido ensurdecedor, rápido e indolor. Demonstrava a verdade de todos os seus temores. Ainda ouviu a mulher do tenente suplicar aos gritos pela sua vida. Todos os que presenciaram a cena clamaram para que o maldito estampido não ecoasse naquela manhã, mas não houve jeito. De repente, fez-se o silêncio, um zumbido distante substituiu as vozes à sua volta. Uma calma reinou sobre o seu corpo, ainda que a cabeça levasse um soco violento pelo impacto da bala.
Por um tempo imperceptível Gregório sentiu que todas as suas esperanças haviam se esvaído. Esperança de continuar a viver, de rever a família, de se dedicar mais à sua profissão, de sentir que não havia dúvidas sobre a sua inocência. As pernas enfraqueceram, o corpo cambaleou, a integridade desmoronou, a esperança se foi. Os joelhos curvaram-se para frente e tocaram o chão como se implorassem por uma última chance. O corpo não suportou o peso de tamanha injustiça praticada. Caiu de bruços, manchando de sangue o chão e a vida do tenente. O rosto de encontro à terra, o corpo revirado, a alma despedaçada, uma tragédia dissipada no ar desesperador daquela manhã. Os gritos, os choros, o desespero das testemunhas eram a maior prova do absurdo cometido. Findou-se uma vida em sua plenitude. Ceifaram-se as esperanças. Acabaram-se os sonhos, enterrou-se o futuro. Nada mais havia que trouxesse a harmonia de volta. Vingança, desespero, ódio, irracionalidade, preconceito racial. Muitas razões sobravam na mente do matador, mas poucas foram as chances da vítima. Só restou um corpo humilhado, sob os olhares pasmos dos que presenciaram a cena. Sete da manhã de 17 de outubro de 1927. Caiu morto, sem chances de defesa".
Nota: Si vis pacem, para bellum significa "Se queres a paz, prepare-se para a guerra"
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Eneas Barros é escritor piauiense, nas redes sociais.
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