Ao ver tanto ódio destilado contra a Presidente Dilma, fico me perguntando qual seu real significado. Não creio que o motivo seja político-eleitoral somente. Nunca vi isso no Brasil contra nenhum dos Presidentes anteriores. Oposições, intrigas, lambanças, crimes, brigas políticas, CPIs, impeachment, sim. Mas o escárnio, o vilipêndio, a humilhação pública, o ódio sumário, centrados na pessoa, não. Nunca vi. Este ódio que fez o candidato Aécio chamá-la, em cadeia nacional, de leviana. Esse ódio que fez um estádio de futebol mandá-la tomar no cu, num evento transmitido para o mundo todo. Este ódio que fez um jovem ir aos Estados Unidos para poder olhar “na cara dela e dizer: ‘sua vaca’!”. Este ódio, alimento do coro diuturno, que a chama de ‘sapatão’. Este ódio que produziu adesivos com sua imagem de pernas arreganhadas, simulando um estupro... (insuportável...).
Definitivamente, esta barbárie não tem cunho político-eleitoral. Penso que não há outro modo de entender tais fatos: trata-se de machismo. Simples, assim. Grave, assim. O problema maior é que Dilma é mulher. Nossa sociedade patriarcal, centrada no falo, não suporta uma mulher no comando do país. Não suporta uma mulher bem sucedida, competente, poderosa, vitoriosa. Definitivamente, Dilma está fora do seu lugar ‘natural’; está cometendo uma afronta, um ultraje. É preciso, então, derrotá-la. Derrotá-la não apenas politicamente. É preciso desqualificá-la, arrasá-la em praça pública. É preciso, por meio dela, ‘ensinar’ a todas as mulheres, para que nem tentem ir tão longe. Misoginia pura.
Nos nossos dias, no nosso país, é a misoginia que sustenta a prática ‘política’, que burla a institucionalidade, que come por dentro a governabilidade, que substitui a polidez no trato pessoal e que ameaça nocautear a luta das mulheres pelo respeito e pelo direito igual às possibilidades socialmente construídas. Dentre elas, o direito à vida. O machismo é o ácido abundante que escorre capilarmente por todos os cantos, corroendo não só o Governo Dilma, mas também a Dilma mulher, mãe, avó, amada-amante, profissional. Que corrói um tantinho de cada mulher brasileira, em cada cantinho do nosso enorme país. Por isso, não é à toa a quantidade de assassinatos, estupros, agressões, violências várias a que assistimos todos os dias contra as mulheres brasileiras.
Sabendo dos problemas políticos do Governo Dilma, sou partidária de muitas críticas que a ele são feitas. Muitas críticas. Mas como mulher, sinto-me cortada na carne, exposta, ferida na alma cada vez que esses gestos grotescos são desferidos contra a Presidenta. E do ponto de vista imediato, sinto-me cada vez mais acuada pelos estupradores, misóginos, matadores de mulheres que pululam por aí. Livres para agir, vez que abonados pelas práticas da sociedade contra sua Presidenta. Até quando, Brasil? Até quando, mulheres do meu país?
-----------------
Valéria Silva - Profª Permanente do Programa de Pós-Graduação em Sociologia/UFPI - nas redes sociais.
Valéria Silva
Comentários
Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião desta página, se achar algo que viole os termos de uso, denuncie.