Reiteradas vezes escrevi sobre esse tema neste espaço opinativo, contudo jamais será demais reescrever e continuar batendo na mesma temática porque a realidade clama por mudanças culturais e posturais em nosso país. Não se trata somente demudanças nos modos de pensar e agir dos homens, mas também das mulheres que condenam mulheres e as situam na condição de culpadas pelos crimes que sofrem.
Então nos deparamos com um dilema: o que fazer em um país em que, uma em cada cinco mulheres já foi espancada pelo marido e onde uma mulher é estuprada a cada três horas. Esse panorama acompanhado por várias pesquisas de órgãos oficiais e por instituições de proteção a mulher no terceiro setor, nos dá conta de que a guerra física entre os sexos continua sangrenta no Brasil, enquanto os dados nos indicam que não há indícios de uma mudança em nossa sociedade, apesar do maior acesso à educação e aos bens materiais, até porque a violência registrada contra a mulher acontece em todas as classes sociais indistintamente.
Entre janeiro e outubro de 2015 a Central de Atendimento à Mulher vinculada à Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República(SPM-PR) registrou que 38,72% das brasileiras em situação de violência contínua sofrem agressões diariamente, enquanto que 33,86% na mesma situação são agredidas semanalmente. O mais grave talvez figure no fato de que o agressor resida na mesma casa, quase sempre, homens com quem mantém ou mantiveram relacionamento afetivo, em 67,36% dos casos, as violências foram cometidas por companheiros, cônjuges, namorados ou amantes, ou pessoas que com quem já não se relacionam. Mas a violência não para por aí, em 27% dos casos relatados para a Central de Atendimento, o agressor era um familiar, amigo ou vizinho. O fato é que em 85,85% dos casosregistrados no número 180 da SPM-PR as situações de agressão contra a mulher aconteceram em ambiente doméstico e familiar, o que nos sugere que a guerra entre os sexos acontece em grande parte no próprio lar, nas paredes do privado sem os olhares do público, onde as mulheres continuam “dormindo com o inimigo” e não possuem força, nem coragem para reagir e para mudar, ou, mesmo quando o fazem, continuam a ser agredidas, chegando em muitos casos a ser assassinadas.
Os dados divulgados pela Secretaria de Políticas para as Mulheres impressionam pelo volume acumulado de violência contra nosso sexo. Somente em 2015, de 63.090 denúncias de agressões contra a mulher, 31.432 eram sobre violência física o que corresponde a 49,82%, enquanto que 19.182 relatavam violência psicológica o que dá cerca de 30,40%, 4.627 ou 7,33% se referiam a violência moral, 3.064ou 4,86% se referiam a violência sexual e até denúncias de cárcere privado que perfazem um total de 3.071.
Recentemente divulgou-se em matéria jornalística nas redes de televisão que uma mulher é estuprada a cada três horas no Brasil, no entanto, as instituições que trabalham em prol da mulher em situação de risco alertam que os dados das pesquisas não revelam a situação real, que deve ser mais agravante ainda, visto que nem todas tem coragem para denunciar ou pelo estado psicológico fragilizado em que ficam ou pelo medo do julgamento moral da sociedade que no Brasil, ainda imputa à mulher a culpa pelo crime do homem.
Por outro lado, se as denúncias na Central de Atendimento da SPM-PR são reduzidas em relação aos crimes sexuais; dados divulgados em outubro de 2015 no Fórum Brasileiro de Segurança Pública em que informações oficiais de todas as secretarias estaduais de Segurança Pública foram condensadas, nos dão conta de que em 2014 houveram cerca de 47.646 estupros registrados, o que representou uma involução em relação à 2013 de cerca de 7% . Mesmo assim, segundo o que foi informado naquela ocasião, uma mulher e/ou criança é violentada no país a cada 11 minutos. Todavia a própria diretora-executiva do Fórum, Samira Bueno, reconhece que não é possível ter dados que retratem o real, já que o crime sexual é o que apresenta maior taxa de subnotificação no mundo.
Na verdade os membros doFórum Brasileiro de Segurança Pública realizado em 2015 trabalham com uma margem de casos que variam entre 136 mil e 476 mil estupros no Brasil em 2014. A projeção menortem como base estudos internacionais, como o ‘National Crime VictimizationSurvey’, que aponta que apenas 35% das vítimas desse tipo de crime prestam queixa. Já a previsão de quase 500 mil estuprostem como base a pesquisa‘Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde', do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que aponta que apenas 10% dos casos são denunciados aos órgãos de segurança competentes.
No que concerne aos casos de homicídios de mulheres, uma estimativa do Ministério da Saúde publicada no Mapa da Violência 2015: homicídio de mulheres no Brasil,realizada com dados de 2013, alertam para o fato de que dos 4.762 casos registrados, cerca de 50,3% foram cometidos por familiares, sendo que 33,2% foram parceiros ou ex-parceiros. Já as mortes violentas de mulheres negras sofreu um aumento de 54% em dez anos, passando de 1.864, em 2003 para 2.875, em 2013.
Nesse cenário devastador em que as mulheres sofrem diariamente vários tipos de violência, a única luz que se apresenta no fim do túnel,vem da lenta, porém crescente efetividade da Lei Maria da Penha que de acordo com informações de uma pesquisa do IPEA realizada em março de 2015 denominada Pesquisa Avaliando a Efetividade da Lei Maria da Penha ( Lei 11.340/2004); a referida lei fez diminuir em cerca de 10% a taxa de homicídios contra mulheres praticados no ambiente familiar.
Por fim e diante de um panorama de guerra em que as vítimas continuam sendo as mulheres indistintamente, clamo para que nossa sociedade pare e pense: - que país estamos construindo para nossos filhos e filhas? Que sociedade doente é a nossa em que homens e mulheres não conseguem conviver em paz e onde homens continuam na idade das cavernas fazendo valer a força bruta para dominar as mulheres?
Lembrando que para denunciar qualquer evento de violência contra a mulher,não é preciso que a pessoa que sofre a violência esteja de acordo, qualquer um que presencie a agressão pode denunciar. Para isto ligue Central de Atendimento à Mulher – 180.
Paz entre os todos é o que queremos!
Ana Regina Rêgo
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