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Segunda-feira, 18 de novembro de 2024
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Ana Regina Rêgo

anareginarego@gmail.com

12/10/2017 - 16h14

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Ana Regina Rêgo

anareginarego@gmail.com

12/10/2017 - 16h14

Propaganda de guerra? Distrações midiáticas? Bodes expiatórios?

Caríssimos leitores, hoje não venho falar de arteou de sua grande importância para todas as sociedades, sobretudo, porque a discussão é longa e antiga e porque vejo nas manifestações culturais um caminho tão importante, quanto a educação para que uma sociedade venha a se tornar igualitária, no sentido cristão mesmo, ou seja, todos com os mesmos direitos e deveres, sobretudo, porque a arte pode ser libertadora e educadora. Não entro no mérito do que é ou não arte,  deixo para o leitor, mas me volto hoje para o campo da comunicação, onde situo minhas pesquisas há vinte anos.

 

 

Venho novamente falar de processos manipulatórios midiáticos que nem de longe nasceram hoje, mas que foram ressuscitados; como exemplo, podemos mencionar as estratégias utilizadas pelos meios de comunicação de massa de 100 anos atrás para colocar populações favoráveis ou contrárias a determinadas decisões governamentais e até completamente contra determinados países a ponto de desejar a guerra e a morte de inocentes.

 

 

Eram outros tempos, outros contextos em que a sociedade de massa composta por indivíduos “atomizados” que não mais tinham o lastro comunitário, nem tampouco o sentimento de nacionalismo, visto que o progresso econômico havia alcançado patamares não vistos nos séculos anteriores, pressupunha, naquele contexto, novas sociabilidades postas pelos desenvolvimentos tecnológicos de então. Naquele momento, promoveu-se um movimento intencional dentro dos meios de comunicação para trabalhar populações inteiras de cada lado do conflito a fim de que se tornassem favoráveis ao seu país, para tanto, atrocidades cometidas por cada país eram escondidas de sua população e atribuídas ao inimigo. Isso aconteceu em todos os lados do conflito, principalmente, na primeira guerra mundial, mas se repetiria com muita força também ao longo da década de 1930 e na segunda guerra, como em governos ditatoriais.

 

 

Um dos exemplos mais gritantes é por certo do general inglês Charteris que ao se deparar com fotos alemãs apreendidas, tomou uma decisão que mudaria os rumos da guerra e colocaria a China contra a Alemanha. Duas fotos estavam em suas mãos. A primeiramostrava cadáveres de soldados alemães sendo arrastados para serem enterrados atrás da linha de frente em um determinado ponto do conflito. Já a segunda mostrava cavalos mortos a caminho da fábrica de sabão. O general escolheu para a primeira página do jornal que iria para Xangai, a foto dos soldados alemães, mas a manchete informava em letras garrafais: Cádaveres alemães a caminho da fábrica de sabão.  Vale ressaltar que a imagem ganhou o mundo e colocou populações inteiras contra os alemães mesmo após a guerra.

 

 

A intenção do general era de fato revoltar a opinião pública chinesa contra os alemães, visto que os mortos são sagrados e sua profanaçãonão é admitida. Esse episódio é posto como um dos responsáveis pela declaração chinesa de guerra contra as potências centrais lideradas pela Alemanha.

 

 

Esse tipo de mensagem intencionalmente manipulada fazia parte do escopo de teorias sociológicas que se aplicavam ao campo da comunicação eque na época se propagavam como extremamente eficazes, nesse caso, estudava-se mensagens como balas mágicas. Em sua base, instâncias sociológicas e psicológicas. Mas em resumo a teoria hipodérmica( agulha hipodérmica) ou da bala mágica trabalha pontualmente com estímulos e respostas no modelo behaviorista.

 

 

Obviamente, o estado social de inocência e credulidade em relação aos meios de comunicação e ao jornalismo vai se transformando ao passo em que as sociedades e indivíduos percebem as manipulações que lhes foram impostas e passama criar filtros sociais e pessoais críticos, desconfiando das verdades  e passando a conferir algumas informações.

 

Obviamente, essa realidade em muito diverge do que vivemos, mas que ao que parece nos leva para caminhos similares do ponto de vista da incapacidade crítica de um público receptor de mensagens.Hoje, teoricamente não vivenciamos os mesmos processos que a sociedade de massas do inicio do século XX. No mercado as estratégias de consumo apontam para a diferenciação e individuação, segmentação extrema dos produtos voltados para desejos particulares. Do ponto de vista da comunicação, os contextos são reticulares(redes) e direcionadas ao eu, individuo empoderado que teoricamente, escolhe o que assistir e a que se filiar. Todavia, me parece que estudos são necessários nesse momento, visto que por via de caminhos distintos, parece que estamos tão vulneráveis como antes. As estratégias comunicativas mais eficazes hoje e que adotam a lei do estímulo- resposta para se alcançar determinado sentimento de adesão ou de rejeição do público não nos chega pelas mensagens das mídias de massa, mas através das redes sociais, em nossosperfis pessoais. No caso do whatsaap nos chegam pessoalmente e nos proporcionam experiências individuais que se tornam coletivas pela adesão massiva dos que se sentem ameaçados ou que se identificam com alguma mensagem. Poucos refletem, poucos apuram, poucos procuram por todos os lados da informação. O resultado termina sendo o de cem anos atrás: uma população inteira contra um corpo, ou uma obra de arte, um político, uma mulher, um negro, etc..

 

Poucos se perguntam sobre o contexto em que determinado vídeo e sua mensagem foram feitos. Normalmente informações adicionais que mudariam as opiniões são extirpadas e em seu lugar são colocados informações vazias.

 

 

O exemplo do MAM me parece tão simbólico quanto dos soldados alemães que segundo o jornal inglês seriam transformados em sabão. Com um agravante, naquele momento o general inglês estava em guerra e desejava conseguir um aliado estratégico. Aqui de fato, também estamos em guerra, só que de outra ordem e a mensagem transmitida por vídeo através do whatsaap, diretamente a cada cidadão, tinha não só a intencionalidade da repugnância da experiência imposta à criança, como a criação de uma distração midiática poderosa capaz de tirar a atenção do público dos horrores de Brasília em um período crítico em que todos os grandes comandantes estão sendo denunciados. O contexto da performance que é na verdade uma releitura. As placas e indicações de não apropriado para menores, tudo negligenciado na mensagem.

 

E porque a arte e a classe artística brasileira viraram bode expiatório? Talvez porque na cabeça dos estrategistas que pretendem levar o Brasil ao conservadorismo supremo em todas as áreas, a arte seja, não um dos meio de libertação, esclarecimento, formação e educação; mas um meio de  ataque aos valores morais. Na cabeça dessas pessoas a arte é suja, porque o corpo para elas é sujo. Enquanto que para os artistas a arte não tem juízo de valor nesse sentido, ela é e deve de fato ser engajada e libertadora.

 

 

Todavia, essa é uma das estratégias dos movimentos conservadores que surgem a todo momento. Outra bem mais potente e que a essa se alia, tem tratado de igualar os movimentos e os processos ditatoriais e totalitários, como denunciei no artigo anterior, aos processos e valores democráticos. Ou seja, dizem que a ditadura não existiu e que era de fato uma democracia. Ora, são movimentos antagônicos e completamente divergentes. Uma democracia não pode ter características ditatoriais, como restrição de liberdade ao pensamento, nem as liberdades individuais, por exemplo. Então peço aos meus leitores que procurem se informar sobre o que é Democracia e o que é uma ditadura, para não caírem mais uma vez nas armadilhas de quem deseja subjugar o Brasil. Fica a dica. 

Ana Regina Rêgo

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