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Segunda-feira, 18 de novembro de 2024
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Ana Regina Rêgo

Ana Regina Rêgo

anareginarego@gmail.com

21/12/2017 - 08h44

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Ana Regina Rêgo

anareginarego@gmail.com

21/12/2017 - 08h44

E lá vem o Natal!

Para os Cristãos estamos vivendo o tempo do Advento, primeiro tempo do ano litúrgico e que antecede o Natal e, é marcado pela preparação e alegria da chegada de Cristo. A ideia é praticar o arrependimento e promover a paz.

Do ponto de vista mercadológico é tempo de gastar o que não se tem para comprar e comprar e ostentar, mas também é tempo de confraternização, desde que se possa postar as comidas e as fotos que tiramos em lugares caros que pagamos com cartões de créditos que nos mandem reféns do consumismo exacerbado e da visibilidade instantânea, sob pena de sermos alijados do processo social, visto que, se não postamos imagens de nossas reuniões/confraternizações é porque temos poucos ou não temos amigos.

Na verdade,  essência, aparência e experiência estão dissociadas e vivenciamos uma anomalia coletiva social. Nem de longe somos o que aparentamos. Essência e aparência se distanciaram de tal modo, que a semblânciaestá cada vez mais distorcida. E essa prática de se tornar visível e potencializar a visibilidade nos distancia da experiência sensível e aqui me refiro ao simples encontrar e rir com os amigos em um ambiente simples e privado, sem necessidade de publicizar a intimidade com fotos e vídeos.

Do Natal dos meus tempos de infância, uma das memórias mais bonitas se refere às aventuras do fugir da Igreja (em Picos) por meia hora e descer pela feira para visitar as barracas iluminadas que vendiam coisas muito simples como bonecas sem adornos e carrinhos com pneus que nem se moviam. Contudo, a melhor memória, além do abrir o brinquedo surpresa,  era a reunião de amigos na manhã do dia 25 de dezembro para mostrar, compartilhar e brincar coletivamente nas calçadas.

Hoje vemos muitos pais programando midiaticamente crianças em perfis nas redes sociais para conseguir mais e mais seguidores a partir de temáticas que escolhem falar em vídeos e imagens, objetivando não só vender produtos mercadológicos, mas também se tornar produtos em um processo de objetificação do humano como escravo do mercado que o obriga a manter-se no ciclo mercadológico, produzindo gratuitamente para as redes sociais onde se localizam, potencializando a projeção imagética para conseguir seguidores e se relacionando intensamente com a imagens do entorno, de forma que as sociabilidades das crianças produtos são cíclicas e virtuais. No Natal essas crianças produtos trabalham muito mais, visto que é tempo de vender!

O Advento cuja ideia é muito interessante e necessária pois sugere uma pausa no mundo e nos convida a refletir sobre o que fizemos e que podemos jogar fora e mudar daqui em diante. É, como dito, principalmente, o tempo de esperar o Cristo numa simbologia de espiritualidade em busca do outro e da paz; entretanto, o Advento termina sendo lembrado somente nas cerimônias religiosas. Ao sair da Igreja o ciclo de sociabilidades marcada pela visibilidade e pelo consumismo persiste.

Na verdade, o Natal do mercado começa em outubro. As lojas começam a se preparar para as vendas do Natal dois meses antes. A maioria muda a decoração e investe pesado na aparência para atrair o público consumidor. Em Teresina muitas lojas enfeitam até as ruas onde se localizam, gesto bonito por sinal, mas colocar o coitado do Papai Noel na rua em pleno B-R-O BRÓ Teresinense não é muito adequado.

O ideal mesmo seria então a proposição de  Drummond  na crônica Organiza o Natal publicada no livro Cadeira de Balanço ( 1972) “[...] cada vez mais o ano se compõe de 10 meses; imperfeitamente embora, o resto é Natal. É possível que, com o tempo, essa divisão se inverta: 10 meses de Natal e 2 meses de ano vulgarmente dito. E não parece absurdo imaginar que, pelo desenvolvimento da linha, e pela melhoria do homem, o ano inteiro se converta em Natal, abolindo-se a era civil, com suas obrigações enfadonhas ou malignas. Será bom”.

Esse Natal proposto por Drummond tem muito de um Natal de altruísmo e compreensão, focado no ver no outro e não apenas nas compras e na visibilidade, afinal naquela época não havia essa potencialização atual que possivelmente esconda o vazio coletivo social.  E continua Drummond “[...] Então nos amaremos e nos desejaremos felicidades ininterruptamente, de manhã à noite, de uma rua a outra, de continente a continente, de cortina de ferro à cortina de nylon — sem cortinas. Governo e oposição, neutros, super e subdesenvolvidos, marcianos, bichos, plantas entrarão em regime de fraternidade. Os objetos se impregnarão de espírito natalino, e veremos o desenho animado, reino da crueldade, transposto para o reino do amor: a máquina de lavar roupa abraçada ao flamboyant, núpcias da flauta e do ovo, a betoneira com o sagüi ou com o vestido de baile. E o supra-realismo, justificado espiritualmente, será uma chave para o mundo”.

A ideia é de um Natal eterno, não mais como uma parada de preparação, mas uma extensão da pausa, prolongando os sentimentos de benevolência, de amor ao próximo, de compreensão, de respeito a todos. Nas palavras de Drummond “[...]Completado o ciclo histórico, os bens serão repartidos por si mesmos entre nossos irmãos, isto é, com todos os viventes e elementos da terra, água, ar e alma. Não haverá mais cartas de cobrança, de descompostura nem de suicídio. O correio só transportará correspondência gentil, de preferência postais de Chagall, em que noivos e burrinhos circulam na atmosfera, pastando flores; toda pintura, inclusive o borrão, estará a serviço do entendimento afetuoso. A crítica de arte se dissolverá jovialmente, a menos que prefira tomar a forma de um sininho cristalino, a badalar sem erudição nem pretensão, celebrando o Advento”.

Infelizmente os sonhos do poeta nem sempre se realizam, mesmo de um poeta de primeira grandeza como Drummond. Todavia como nos diz a  música interpretada pela Simone e que ainda hoje embala as lojas do centro da cidade, Então é Natal! Momento de ver de outro e de desenvolver o sentimento de respeito, de desenvolver o sentimento de justiça e tentar fazer algo pelas milhares de mulheres que são estupradas e assassinadas em nosso país a cada ano. Desenvolver o respeito por todas as cores e opções e pensar que tentar regular o corpo do outro, não é uma tarefa sua, mas de cada um com seu próprio corpo.

Então lá vem o Natal e estamos na preparação, então vamos abrir o coração e perceber que nenhum de nós é melhor que o outro. Que nenhuma crença é superior a outra e guarda a verdade absoluta.

Então que venha o Natal e que o amor se espalhe e permaneça entre nós, nos levando  a fazer o bem sempre mais e mais;  não porque algum Deus nos mandou fazer o bem, mas simplesmente, porque é o que sentimos que devemos fazer, como uma injunção ética interna que nos impele a ver em cada outro,  parte de nós mesmos. FELIZ NATAL!Para os Cristãos estamos vivendo o tempo do Advento, primeiro tempo do ano litúrgico e que antecede o Natal e, é marcado pela preparação e alegria da chegada de Cristo. A ideia é praticar o arrependimento e promover a paz.

Do ponto de vista mercadológico é tempo de gastar o que não se tem para comprar e comprar e ostentar, mas também é tempo de confraternização, desde que se possa postar as comidas e as fotos que tiramos em lugares caros que pagamos com cartões de créditos que nos mandem reféns do consumismo exacerbado e da visibilidade instantânea, sob pena de sermos alijados do processo social, visto que, se não postamos imagens de nossas reuniões/confraternizações é porque temos poucos ou não temos amigos.

Na verdade,  essência, aparência e experiência estão dissociadas e vivenciamos uma anomalia coletiva social. Nem de longe somos o que aparentamos. Essência e aparência se distanciaram de tal modo, que a semblânciaestá cada vez mais distorcida. E essa prática de se tornar visível e potencializar a visibilidade nos distancia da experiência sensível e aqui me refiro ao simples encontrar e rir com os amigos em um ambiente simples e privado, sem necessidade de publicizar a intimidade com fotos e vídeos.

Do Natal dos meus tempos de infância, uma das memórias mais bonitas se refere às aventuras do fugir da Igreja (em Picos) por meia hora e descer pela feira para visitar as barracas iluminadas que vendiam coisas muito simples como bonecas sem adornos e carrinhos com pneus que nem se moviam. Contudo, a melhor memória, além do abrir o brinquedo surpresa,  era a reunião de amigos na manhã do dia 25 de dezembro para mostrar, compartilhar e brincar coletivamente nas calçadas.

Hoje vemos muitos pais programando midiaticamente crianças em perfis nas redes sociais para conseguir mais e mais seguidores a partir de temáticas que escolhem falar em vídeos e imagens, objetivando não só vender produtos mercadológicos, mas também se tornar produtos em um processo de objetificação do humano como escravo do mercado que o obriga a manter-se no ciclo mercadológico, produzindo gratuitamente para as redes sociais onde se localizam, potencializando a projeção imagética para conseguir seguidores e se relacionando intensamente com a imagens do entorno, de forma que as sociabilidades das crianças produtos são cíclicas e virtuais. No Natal essas crianças produtos trabalham muito mais, visto que é tempo de vender!

O Advento cuja ideia é muito interessante e necessária pois sugere uma pausa no mundo e nos convida a refletir sobre o que fizemos e que podemos jogar fora e mudar daqui em diante. É, como dito, principalmente, o tempo de esperar o Cristo numa simbologia de espiritualidade em busca do outro e da paz; entretanto, o Advento termina sendo lembrado somente nas cerimônias religiosas. Ao sair da Igreja o ciclo de sociabilidades marcada pela visibilidade e pelo consumismo persiste.

Na verdade, o Natal do mercado começa em outubro. As lojas começam a se preparar para as vendas do Natal dois meses antes. A maioria muda a decoração e investe pesado na aparência para atrair o público consumidor. Em Teresina muitas lojas enfeitam até as ruas onde se localizam, gesto bonito por sinal, mas colocar o coitado do Papai Noel na rua em pleno B-R-O BRÓ Teresinense não é muito adequado.

O ideal mesmo seria então a proposição de  Drummond  na crônica Organiza o Natal publicada no livro Cadeira de Balanço ( 1972) “[...] cada vez mais o ano se compõe de 10 meses; imperfeitamente embora, o resto é Natal. É possível que, com o tempo, essa divisão se inverta: 10 meses de Natal e 2 meses de ano vulgarmente dito. E não parece absurdo imaginar que, pelo desenvolvimento da linha, e pela melhoria do homem, o ano inteiro se converta em Natal, abolindo-se a era civil, com suas obrigações enfadonhas ou malignas. Será bom”.

Esse Natal proposto por Drummond tem muito de um Natal de altruísmo e compreensão, focado no ver no outro e não apenas nas compras e na visibilidade, afinal naquela época não havia essa potencialização atual que possivelmente esconda o vazio coletivo social.  E continua Drummond “[...] Então nos amaremos e nos desejaremos felicidades ininterruptamente, de manhã à noite, de uma rua a outra, de continente a continente, de cortina de ferro à cortina de nylon — sem cortinas. Governo e oposição, neutros, super e subdesenvolvidos, marcianos, bichos, plantas entrarão em regime de fraternidade. Os objetos se impregnarão de espírito natalino, e veremos o desenho animado, reino da crueldade, transposto para o reino do amor: a máquina de lavar roupa abraçada ao flamboyant, núpcias da flauta e do ovo, a betoneira com o sagüi ou com o vestido de baile. E o supra-realismo, justificado espiritualmente, será uma chave para o mundo”.

A ideia é de um Natal eterno, não mais como uma parada de preparação, mas uma extensão da pausa, prolongando os sentimentos de benevolência, de amor ao próximo, de compreensão, de respeito a todos. Nas palavras de Drummond “[...] Completado o ciclo histórico, os bens serão repartidos por si mesmos entre nossos irmãos, isto é, com todos os viventes e elementos da terra, água, ar e alma. Não haverá mais cartas de cobrança, de descompostura nem de suicídio. O correio só transportará correspondência gentil, de preferência postais de Chagall, em que noivos e burrinhos circulam na atmosfera, pastando flores; toda pintura, inclusive o borrão, estará a serviço do entendimento afetuoso. A crítica de arte se dissolverá jovialmente, a menos que prefira tomar a forma de um sininho cristalino, a badalar sem erudição nem pretensão, celebrando o Advento”.

Infelizmente os sonhos do poeta nem sempre se realizam, mesmo de um poeta de primeira grandeza como Drummond. Todavia como nos diz a  música interpretada pela Simone e que ainda hoje embala as lojas do centro da cidade, Então é Natal! Momento de ver de outro e de desenvolver o sentimento de respeito, de desenvolver o sentimento de justiça e tentar fazer algo pelas milhares de mulheres que são estupradas e assassinadas em nosso país a cada ano. Desenvolver o respeito por todas as cores e opções e pensar que tentar regular o corpo do outro, não é uma tarefa sua, mas de cada um com seu próprio corpo.

Então lá vem o Natal e estamos na preparação, então vamos abrir o coração e perceber que nenhum de nós é melhor que o outro. Que nenhuma crença é superior a outra e guarda a verdade absoluta.

Então que venha o Natal e que o amor se espalhe e permaneça entre nós, nos levando  a fazer o bem sempre mais e mais;  não porque algum Deus nos mandou fazer o bem, mas simplesmente, porque é o que sentimos que devemos fazer, como uma injunção ética interna que nos impele a ver em cada outro,  parte de nós mesmos. FELIZ NATAL!
 

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