As promessas do capitalismo e do desenvolvimento desenfreado não se cumpriram e o mundo sente hoje, as consequências de uma exploração exacerbada de seus recursos naturais, assim como, se ressente das potencializadas desigualdades sociais, sobretudo, no hemisfério sul que continua, de forma distinta do passado, a ser explorado, como o foi nos 5 últimos séculos.
Nesse cenário de insatisfações e incertezas a sociedade recorre aos salvadores da pátria com suas promessas de uma salvação terrena através de uma economia de mercado liberal potencializada e aliada à ideologia de austeridade econômica, de um lado; enquanto do outro, vendem a salvação após a morte a ser conquistada com uma vida de austeridade moral, em grande medida nos moldes da idade média.
No meio disso tudo, o conservadorismo ganha terreno na geopolítica mundial e vai conquistando territórios, tanto no ambiente econômico quanto moral (ou de uma falsa moral), mas as consequências são inevitáveis.
O Chile no momento vive momentos de contestações e protestos, o maior dos motivos:_ o acirramento crescente da desigualdade social embalada pela privatização dos serviços públicos, pela previdência injusta e que tem relegado os aposentados à extrema pobreza, pela privatização da educação e por um sistema de saúde privado e inacessível, lá não existe SUS. Todavia, mesmo com tudo isso, o nível de desigualdade no Chileé inferior ao Brasil, onde segundo a Fundação Getúlio Vargas, em pesquisa divulgada recentemente, de 2014 até os dias atuais, a metade da população mais pobre teve a renda diminuída em 17,1%. Já a classe média que havia crescido exponencialmente nos primeiros governos do Partidos dos Trabalhadores e ocupa hoje 40% da base da pirâmide econômica, teve perdas da ordem de 4,16%. Em contraposição, os 10% mais ricos tiveram aumento de renda da ordem de 2,25%, já os 1% mais ricos cresceram suas fortunas em 10,11%.
Alguns dias antes do Chile, o Equador experimentou momentos de revolta por motivos similares. Em outros locais do mundo essas e outras insatisfações estão na pauta. Mas efetivamente o que há de errado com o mundo e com modelo de país que estamos abraçando no Brasil ? O que as reformas aprovadas trarão de consequências a médio e longo prazo?
A reforma da previdência, recém-aprovada, foca potencialmente no trabalhador, reduzindo as chances de uma aposentadoria plena, pelas exigências de tempo mínimo de contribuição e idade mínima para conseguir o benefício, sendo 65 para homens, em um país em que a expectativa de vida não ultrapassa os 72 anos para o sexo masculino, por exemplo. Enquanto isso, não se institui uma reforma tributária que imponha uma taxação justa às grandes fortunas dos tais 1% mais ricos que possuem, no conjunto, uma fortuna superior aos bens de mais de 50% da população brasileira. A reforma trabalhista do governo anterior autorizou a precarização das condições de trabalho e a redução da remuneração, e, em grande medida autorizou grandes turnos de trabalho de até 20 horas, mas o atual governo tem ainda proposições mais radicais que envolvem por exemplo, as folgas semanais.
No frigir dos ovos, em geral as reformas aumentam a desigualdade. Estamos, portanto, na contramão da história, estamos na via contrária aos objetivos do milênio definidos entre o final do século passado e este em que nos encontramos, e, dentre os quais destacamos: erradicar a pobreza extrema e a fome; promover a educação de forma universal; promover a igualdade de gênero; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater as doenças infectocontagiosas; garantir a sustentabilidade ambiental do planeta.
Desejos e objetivos que parecem já foram esquecidos pelos governos e pelas populações. O modelo que estamos abraçando nos leva a promover tudo ao contrário do que desejávamos há alguns anos.
Diante dos absurdos e distopias sociais que estamos vivenciando recorro mais uma vez a Amartya Sen, para quem o desenvolvimento deve ser pensado como um meio de propiciar uma prática de liberdade a todos, e, portanto, deve ser estendido a todos os povos. Assim como Aristóteles, para quem “a riqueza não é manifestadamente o bem que buscamos, pois ela é meramente utilitária, em vista de outra coisa”, Sen entende a produção de riqueza a partir de um processo desenvolvimentista, como um meio para que possamos ter uma melhor qualidade de vida em todos os sentidos. Como ele bem afirma, o desenvolvimento é o caminho para que as necessidades sejam supridas e as barreiras removidas, desde as necessidades primárias, às escolhas secundárias. As realizações que cada pessoa pode consolidar dependem das oportunidades econômicas, que por sua vez, estão interligadas com as oportunidades educacionais, as liberdades políticas e sociais, os direitos básicos, os estímulos positivos e as conquistas que for acumulando ao longo de sua experiência em sociedade. Do ponto de vista da orientação para o desenvolvimento, esta perspectiva tira o foco do meio e o leva para os fins sociais envolvidos. A economia não é mais entendida como os meios para se alcançar o aumento da produção, da industrialização, dos rendimentos, da tecnologia, mas sim, como um meio que pode vir a melhorar a vida das sociedades constituintes do nosso planeta na contemporaneidade. Segundo o mesmo autor, “a visão do desenvolvimento como liberdade desloca o foco da análise para a capacidade das pessoas de terem a vida que valorizam”. Contudo, vale ressaltar que essa concepção que vislumbra o papel das liberdades como finalidade do desenvolvimento, não desconsidera o papel instrumental do último, pois para Amartya Sen, “ a expansão da liberdade é, simultaneamente, o fim prioritário e o meio principal do desenvolvimento”.
Por outro lado, outro aspecto intrínseco ao desenvolvimento como pensado por Sen, é o que envolve numa mesma “moeda” a sustentabilidade tão propagada e a garantia dos direitos humanos. Essa vinculação ocorre de forma direta e tem laços estreitos, onde a superação dos problemas e necessidades estão intimamente ligados ao direito a ter direitos.De um modo básico podemos elencar os direitos democráticos, civis, políticos que incluem o direito à liberdade de expressão, o direito a associação, dentre outros, etc.
No livro Desenvolvimento e Liberdade, Sen pensa o desenvolvimento das populações como um processo de expansão das liberdades reais dos indivíduos, distanciando-se de uma visão que concebe o desenvolvimento como simples crescimento do PIB-Produto Interno Bruto, rendas pessoais e avanços tecnológicos, dentre outros, como dito. Para ele, o desenvolvimento das liberdades é um dos pilares principais para se pensar a sustentabilidade. Em seu ponto de vista, se desejamos avançar rumo à sustentabilidade das sociedades e a uma democracia planetária será necessário reconhecer e garantir outros direitos além dos políticos e civis, que ainda que sejam imprescindíveis não são suficientes. Assim é que, o direito à alimentação, a educação, a saúde, a moradia e, a um trabalho digno podem, conjuntamente, fazer a diferença no crescimento das sociedades rumo ao bem estar.
Enquanto isso, entretanto, nós remamos contra a maré e nos situamos no lado contrário da vida com igualdade para todos
Nesse cenário de insatisfações e incertezas a sociedade recorre aos salvadores da pátria com suas promessas de uma salvação terrena através de uma economia de mercado liberal potencializada e aliada à ideologia de austeridade econômica, de um lado; enquanto do outro, vendem a salvação após a morte a ser conquistada com uma vida de austeridade moral, em grande medida nos moldes da idade média.
No meio disso tudo, o conservadorismo ganha terreno na geopolítica mundial e vai conquistando territórios, tanto no ambiente econômico quanto moral (ou de uma falsa moral), mas as consequências são inevitáveis.
O Chile no momento vive momentos de contestações e protestos, o maior dos motivos:_ o acirramento crescente da desigualdade social embalada pela privatização dos serviços públicos, pela previdência injusta e que tem relegado os aposentados à extrema pobreza, pela privatização da educação e por um sistema de saúde privado e inacessível, lá não existe SUS. Todavia, mesmo com tudo isso, o nível de desigualdade no Chileé inferior ao Brasil, onde segundo a Fundação Getúlio Vargas, em pesquisa divulgada recentemente, de 2014 até os dias atuais, a metade da população mais pobre teve a renda diminuída em 17,1%. Já a classe média que havia crescido exponencialmente nos primeiros governos do Partidos dos Trabalhadores e ocupa hoje 40% da base da pirâmide econômica, teve perdas da ordem de 4,16%. Em contraposição, os 10% mais ricos tiveram aumento de renda da ordem de 2,25%, já os 1% mais ricos cresceram suas fortunas em 10,11%.
Alguns dias antes do Chile, o Equador experimentou momentos de revolta por motivos similares. Em outros locais do mundo essas e outras insatisfações estão na pauta. Mas efetivamente o que há de errado com o mundo e com modelo de país que estamos abraçando no Brasil ? O que as reformas aprovadas trarão de consequências a médio e longo prazo?
A reforma da previdência, recém-aprovada, foca potencialmente no trabalhador, reduzindo as chances de uma aposentadoria plena, pelas exigências de tempo mínimo de contribuição e idade mínima para conseguir o benefício, sendo 65 para homens, em um país em que a expectativa de vida não ultrapassa os 72 anos para o sexo masculino, por exemplo. Enquanto isso, não se institui uma reforma tributária que imponha uma taxação justa às grandes fortunas dos tais 1% mais ricos que possuem, no conjunto, uma fortuna superior aos bens de mais de 50% da população brasileira. A reforma trabalhista do governo anterior autorizou a precarização das condições de trabalho e a redução da remuneração, e, em grande medida autorizou grandes turnos de trabalho de até 20 horas, mas o atual governo tem ainda proposições mais radicais que envolvem por exemplo, as folgas semanais.
No frigir dos ovos, em geral as reformas aumentam a desigualdade. Estamos, portanto, na contramão da história, estamos na via contrária aos objetivos do milênio definidos entre o final do século passado e este em que nos encontramos, e, dentre os quais destacamos: erradicar a pobreza extrema e a fome; promover a educação de forma universal; promover a igualdade de gênero; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater as doenças infectocontagiosas; garantir a sustentabilidade ambiental do planeta.
Desejos e objetivos que parecem já foram esquecidos pelos governos e pelas populações. O modelo que estamos abraçando nos leva a promover tudo ao contrário do que desejávamos há alguns anos.
Diante dos absurdos e distopias sociais que estamos vivenciando recorro mais uma vez a Amartya Sen, para quem o desenvolvimento deve ser pensado como um meio de propiciar uma prática de liberdade a todos, e, portanto, deve ser estendido a todos os povos. Assim como Aristóteles, para quem “a riqueza não é manifestadamente o bem que buscamos, pois ela é meramente utilitária, em vista de outra coisa”, Sen entende a produção de riqueza a partir de um processo desenvolvimentista, como um meio para que possamos ter uma melhor qualidade de vida em todos os sentidos. Como ele bem afirma, o desenvolvimento é o caminho para que as necessidades sejam supridas e as barreiras removidas, desde as necessidades primárias, às escolhas secundárias. As realizações que cada pessoa pode consolidar dependem das oportunidades econômicas, que por sua vez, estão interligadas com as oportunidades educacionais, as liberdades políticas e sociais, os direitos básicos, os estímulos positivos e as conquistas que for acumulando ao longo de sua experiência em sociedade. Do ponto de vista da orientação para o desenvolvimento, esta perspectiva tira o foco do meio e o leva para os fins sociais envolvidos. A economia não é mais entendida como os meios para se alcançar o aumento da produção, da industrialização, dos rendimentos, da tecnologia, mas sim, como um meio que pode vir a melhorar a vida das sociedades constituintes do nosso planeta na contemporaneidade. Segundo o mesmo autor, “a visão do desenvolvimento como liberdade desloca o foco da análise para a capacidade das pessoas de terem a vida que valorizam”. Contudo, vale ressaltar que essa concepção que vislumbra o papel das liberdades como finalidade do desenvolvimento, não desconsidera o papel instrumental do último, pois para Amartya Sen, “ a expansão da liberdade é, simultaneamente, o fim prioritário e o meio principal do desenvolvimento”.
Por outro lado, outro aspecto intrínseco ao desenvolvimento como pensado por Sen, é o que envolve numa mesma “moeda” a sustentabilidade tão propagada e a garantia dos direitos humanos. Essa vinculação ocorre de forma direta e tem laços estreitos, onde a superação dos problemas e necessidades estão intimamente ligados ao direito a ter direitos.De um modo básico podemos elencar os direitos democráticos, civis, políticos que incluem o direito à liberdade de expressão, o direito a associação, dentre outros, etc.
No livro Desenvolvimento e Liberdade, Sen pensa o desenvolvimento das populações como um processo de expansão das liberdades reais dos indivíduos, distanciando-se de uma visão que concebe o desenvolvimento como simples crescimento do PIB-Produto Interno Bruto, rendas pessoais e avanços tecnológicos, dentre outros, como dito. Para ele, o desenvolvimento das liberdades é um dos pilares principais para se pensar a sustentabilidade. Em seu ponto de vista, se desejamos avançar rumo à sustentabilidade das sociedades e a uma democracia planetária será necessário reconhecer e garantir outros direitos além dos políticos e civis, que ainda que sejam imprescindíveis não são suficientes. Assim é que, o direito à alimentação, a educação, a saúde, a moradia e, a um trabalho digno podem, conjuntamente, fazer a diferença no crescimento das sociedades rumo ao bem estar.
Enquanto isso, entretanto, nós remamos contra a maré e nos situamos no lado contrário da vida com igualdade para todos
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