A pequena Croácia, um pedaço da antiga Iugoslávia, país de 4 milhões de habitantes (metade do Rio de Janeiro) e 56 mil quilômetros quadrados (metade da nanica Islândia) está na final da Copa do Mundo na Rússia, que será decidida neste domingo contra a França.
Depois de dominar o jogo todo e derrotar a poderosa Inglaterra com um gol na prorrogação nesta quarta-feira, a Croácia pode ter dado um grande susto nos comentaristas esportivos e no resto do mundo, menos nos leitores deste Balaio, que já no sábado, dia 7, após a vitória contra a Rússia, dona da casa, leram aqui: “Agora sou Croácia do genial Modric, a grande surpresa da Copa”.
Ninguém falava nela quando a Copa começou, e ninguém esperava que a Croácia pudesse chegar à final.
Este é um dado que justifica o sujeito "Croácia" e o adjetivo “heroica” em caixa alta do título, mas não são os únicos.
Para chegar lá, o time do pequeno grande capitão Modric, para mim o craque da Copa, teve que jogar uma partida a mais do que todos os outros (três prorrogações de 30 minutos) e vencer duas disputas por pênaltis.
A Croácia jogou um dia depois da França, que eliminou a Bélgica no tempo normal, e vai entrar em campo arrebentada na grande decisão.
Pois é exatamente por isso que boto fé e vou torcer por ela para ser a nova campeã mundial, por amor ao futebol feito de raça e talento, não de grana, assim como foi o Brasil quando conquistou seu primeiro mundial em 1958, na Suécia.
Por dois motivos: gosto de futebol bem jogado, sempre torço para o time mais fraco (não por acaso, sou são-paulino desde nascença).
Meu pai viveu nesta mesma terra, em Montenegro, ao sul da Croácia, outro pedaço separado da Iugoslávia, onde o velho Nick passou a maior parte da breve vida dele, antes de vir para o Brasil, e foi lá que conheceu minha mãe, dona Elisabeth, durante a Segunda Guerra.
Quando era moleque, convivi com muitos amigos dele que imigraram para o Brasil. Era uma turma que gostava muito de beber, comer e farrear até o sol raiar, como eu, para desgosto de minha mãe.
Além disso, sempre achei o futebol iugoslavo muito parecido com o brasileiro de antigamente, aquele de quem gostava de brincar com a bola para fazer a alegria da torcida, uma festa.
Modric, o craque do Real Madri, que é o dono da bola na seleção da Croácia, correu mais de 13 quilômetros contra os grandalhões ingleses e só saiu de campo quando o jogo já estava decidido.
Quase sempre, até batendo lateral ou escanteio, levava vantagem, porque a bola gosta dos craques, como nos ensina o sábio Muricy, ex-técnico do São Paulo tricampeão brasileiro, o melhor comentarista da TV brasileira nesta Copa da Rússia, ao lado de Grafite, também ex-tricolor.
Dá gosto de ver este time da Croácia jogar, um time humilde e equilibrado, solidário em todos os setores do campo, ninguém quer ser a estrela nem fica se jogando no chão pedindo falta ou pênalti.
Qual é a receita? Doação, entrega, dedicação, até o último minuto de jogo, sem dar chutão para garantir o resultado.
Esses croatas franzinos, muitos deles estrelas dos grandes campeonatos europeus, jogam mesmo é por amor à camisa, correm atrás e disputam cada bola como se fosse um prato de comida em meio à guerra fratricida que fatiou a Iugoslávia em vários pequenos países, e matou tanta gente.
São filhos dos sobreviventes, são guerreiros, lutam não só por um bicho ou patrocínio milionário, mas pelo seu povo.
Vão enfrentar domingo a velha França, também uma belíssima seleção, que alia a boa técnica à garra, ao amor pelo futebol bem jogado e é formada por 78% de imigrantes ou filhos deles, a maioria africanos.
Nenhum país africano ou sul-americano chegou à fase decisiva, só disputada por europeus, mas esta é a grande novidade da Copa da Rússia: já não importa a origem do jogador, desde que ele seja bom de bola, como foi o nosso Garrincha das pernas tortas do Brasil, que era de outro mundo, e hoje é o menino danado Mbappé da França.
E viva a Croácia, viva a França, viva o bom futebol, a alegria do povo!
Vida que segue.
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Ricardo Kotscho é jornalista, no Balaio do Kotscho.
Depois de dominar o jogo todo e derrotar a poderosa Inglaterra com um gol na prorrogação nesta quarta-feira, a Croácia pode ter dado um grande susto nos comentaristas esportivos e no resto do mundo, menos nos leitores deste Balaio, que já no sábado, dia 7, após a vitória contra a Rússia, dona da casa, leram aqui: “Agora sou Croácia do genial Modric, a grande surpresa da Copa”.
Ninguém falava nela quando a Copa começou, e ninguém esperava que a Croácia pudesse chegar à final.
Este é um dado que justifica o sujeito "Croácia" e o adjetivo “heroica” em caixa alta do título, mas não são os únicos.
Para chegar lá, o time do pequeno grande capitão Modric, para mim o craque da Copa, teve que jogar uma partida a mais do que todos os outros (três prorrogações de 30 minutos) e vencer duas disputas por pênaltis.
A Croácia jogou um dia depois da França, que eliminou a Bélgica no tempo normal, e vai entrar em campo arrebentada na grande decisão.
Pois é exatamente por isso que boto fé e vou torcer por ela para ser a nova campeã mundial, por amor ao futebol feito de raça e talento, não de grana, assim como foi o Brasil quando conquistou seu primeiro mundial em 1958, na Suécia.
Por dois motivos: gosto de futebol bem jogado, sempre torço para o time mais fraco (não por acaso, sou são-paulino desde nascença).
Meu pai viveu nesta mesma terra, em Montenegro, ao sul da Croácia, outro pedaço separado da Iugoslávia, onde o velho Nick passou a maior parte da breve vida dele, antes de vir para o Brasil, e foi lá que conheceu minha mãe, dona Elisabeth, durante a Segunda Guerra.
Quando era moleque, convivi com muitos amigos dele que imigraram para o Brasil. Era uma turma que gostava muito de beber, comer e farrear até o sol raiar, como eu, para desgosto de minha mãe.
Além disso, sempre achei o futebol iugoslavo muito parecido com o brasileiro de antigamente, aquele de quem gostava de brincar com a bola para fazer a alegria da torcida, uma festa.
Modric, o craque do Real Madri, que é o dono da bola na seleção da Croácia, correu mais de 13 quilômetros contra os grandalhões ingleses e só saiu de campo quando o jogo já estava decidido.
Quase sempre, até batendo lateral ou escanteio, levava vantagem, porque a bola gosta dos craques, como nos ensina o sábio Muricy, ex-técnico do São Paulo tricampeão brasileiro, o melhor comentarista da TV brasileira nesta Copa da Rússia, ao lado de Grafite, também ex-tricolor.
Dá gosto de ver este time da Croácia jogar, um time humilde e equilibrado, solidário em todos os setores do campo, ninguém quer ser a estrela nem fica se jogando no chão pedindo falta ou pênalti.
Qual é a receita? Doação, entrega, dedicação, até o último minuto de jogo, sem dar chutão para garantir o resultado.
Esses croatas franzinos, muitos deles estrelas dos grandes campeonatos europeus, jogam mesmo é por amor à camisa, correm atrás e disputam cada bola como se fosse um prato de comida em meio à guerra fratricida que fatiou a Iugoslávia em vários pequenos países, e matou tanta gente.
São filhos dos sobreviventes, são guerreiros, lutam não só por um bicho ou patrocínio milionário, mas pelo seu povo.
Vão enfrentar domingo a velha França, também uma belíssima seleção, que alia a boa técnica à garra, ao amor pelo futebol bem jogado e é formada por 78% de imigrantes ou filhos deles, a maioria africanos.
Nenhum país africano ou sul-americano chegou à fase decisiva, só disputada por europeus, mas esta é a grande novidade da Copa da Rússia: já não importa a origem do jogador, desde que ele seja bom de bola, como foi o nosso Garrincha das pernas tortas do Brasil, que era de outro mundo, e hoje é o menino danado Mbappé da França.
E viva a Croácia, viva a França, viva o bom futebol, a alegria do povo!
Vida que segue.
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Ricardo Kotscho é jornalista, no Balaio do Kotscho.
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