Em 1957, choveu muito pouco no sertão do Caracol. 58 prometia ser um pouco pior. Foi aí que um leva de lavradores desistiu de plantar feijão e mandioca na terra árida da caatinga e aventurou-se a plantar prédios no Planalto Central.O sonho de Juscelino precisava de todos os braços disponíveis no país. Brasília não podia esperar.
O improvável aconteceu: seu Liberato que, ao longo da vida, fizera apenas duas viagens, encarapitou-se num pau de arara e rumou para a "capital da esperança". Uma semana após chegar àquele mundo em ebulição, já estava "fichado". Pela vez primeira na vida, era empregado do governo.
Dona Purcina, cujos sonhos eram água encanada, escola de graça para os meninos e a possibilidade de ganhar algum dinheiro, tratou de arrumar os teréns. Iríamos todos para Brasília em 59. Sempre tão exata e certeira, a velha cometeu apenas um erro: esqueceu de combinar com seu LIberato.
O velho passou apenas nove meses no cerrado. Ao saber que estava chovendo no sertão, desapracatou no rumo de casa.Trazia na malinha de madeira 20 contos, um sapato de lona, duas mudas de roupa e um velho relógio sem um dos ponteiros... Dona Purcina nunca perdoou ao velho por ter abortado um sonho em gestação...
Não imagino o que poderia ter sido a minha vida no chão vermelho do cerrado. Talvez um simples candango, hoje, entocado na Ceilândia. Talvez um assessor de algum político corrupto. Talvez "um número ímpar só pra sobrar na contagem", como naquele verso de Salgado Maranhão.
De uma forma ou de outra, seguramente eu encontraria um jeito de me aproximar de Climério Ferreira, Paulo José Cunha, Edmílson Caminha, Mauro Sampaio e de outros irmãos queridos que animam a cena cultural da capital federal que, cheia de rugas e cicatrizes, completou neste mês, 64 anos de existência. Parabéns, Brasília!
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Cineas Santos é professor, escritor, poeta e produtor cultural - nas redes sociais.
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