Esta foto é assustadora por diversas razões.
A primeira é a cena em si. Um grupo de homens negros, imobilizado ao pescoço por correntes e argolas de ferro, é vigiado por um destacamento armado sob o comando de um oficial branco, de capacete no centro da foto.
À primeira vista, é uma cena típica da época da escravidão africana. A data da foto, porém, é 1907, já no começo do século XX, uma década e meia depois da Lei Áurea do Brasil, o último país a abolir o regime de cativeiro na América.
Os homens agrilhoados são guerreiros do povo a Cuamato, que lutava contra a ocupação portuguesa na África. Angola só obteria sua independência 68 anos mais tarde, no curso de uma sangrenta guerra contra os portugueses.
A foto se encontra exposta hoje em um local de triste lembrança para quem se opôs ao uso da arbitrário da força em Portugal e suas colônias: o Aljube, tétrica prisão política situada nas encostas de Alfama, em frente à Catedral da Sé de Lisboa.
O Aljube é muito antigo. Já era usado como prisão na época dos romanos. O nome vem do período da ocupação islâmica, do árabe “Al-jubb”, que significa masmorra, cisterna ou poço sem água. Teve seu auge, porém, durante a ditadura de Antônio de Oliveira Salazar. Até meados da década de 60 era usado para subjugar os adversários do regime. Os presos ficavam cubículos minúsculos, gradeados e sem janelas. A queda da ditadura salazarista, com a Revolução dos Cravos de abril de 1974, marcou também o fim das guerras e de cinco séculos de ocupação colonial portuguesa na Africa.
Hoje, o Aljube é um museu-memorial ao sonho da liberdade. Em geral, não faz parte do roteiro dos turistas que passam por Lisboa. Mas merece uma visita.
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Laurentino Gomes, escritor - nas redes sociais.
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